São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 1997
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A aposta no Brasil deve continuar

MAILSON DA NÓBREGA

Os recentes acontecimentos na Ásia, o receio de sua repetição no Brasil e os lucros acumulados no mercado acionário são os principais fatores responsáveis pelos movimentos de venda e por momentâneas perdas em nosso mercado acionário.
O impulso de venda foi amplificado por pequenos investidores, que haviam deixado os fundos de renda fixa atraídos pelos altos lucros do mercado acionário e o deixaram rapidamente, muitos com prejuízos.
As cassandras identificaram nessa situação os sinais de crise iminente, prevendo fuga de capitais, crise cambial e fracasso do programa de estabilização.
Não se podem desprezar os riscos de uma crise e do êxito de um ataque especulativo contra a nossa moeda. A causa seria uma perda de confiança, detonada pela percepção de insucesso nas reformas e da insustentabilidade da política cambial.
O que faria os investidores estrangeiros abandonarem em massa o mercado acionário não seria, portanto, uma temporária piora do ambiente, mas a deterioração persistente dos fundamentos da política econômica.
Há sinais inequívocos de que os investidores estrangeiros têm-se dado conta, cada vez mais, de que o Brasil pode ter entrado numa rota de modernização que o levará ao aproveitamento de seu imenso potencial.
O país estaria preparando-se, mental e estruturalmente, para uma nova e favorável fase. Ninguém pode garantir que essa expectativa se concretize, mas as chances são muito grandes.
É por isso que tem crescido o interesse no Brasil por parte dos investidores institucionais -principalmente os fundos de pensão e os fundos mútuos- e dos "private equity funds".
Os "private equity funds" são organizações que levantam recursos para investir em determinadas empresas, adquirindo, em geral, uma parcela minoritária de seu capital. Não gerenciam as empresas. Apostam no seu sucesso.
Esses fundos surgiram nos EUA durante os anos 80, na onda de fusões e aquisições de empresas da época. No início da década de 90, investiram nos "tigres" asiáticos. Desde 1993, começaram a vir para a América Latina, particularmente para o Brasil.
Os investidores institucionais têm adquirido uma visão de longo prazo em relação a mercados emergentes como o brasileiro. Muitos precisam buscar neles alternativas de melhor rendimento, mormente os fundos de pensão americanos.
Por essas e outras razões, os investimentos de caráter permanente nos mercados emergentes constituem um dos grandes fenômenos financeiros deste final de século.
O interesse por esses mercados não é apenas dos investidores institucionais. Há estudos mostrando que o homem comum, em países como os EUA, acompanha o seu desempenho. Afinal, ele tem cotas dos fundos mútuos ou participa dos fundos de pensão.
Segundo o ex-subsecretário de Comércio Exterior dos EUA, Jeffrey Garten ("Foreign Affairs", "Gazeta Mercantil", 9/5/97), o governo americano considera promissores, em termos de comércio e investimento, vários desses mercados.
São os casos de países como México, Brasil, Argentina, África do Sul, Polônia, Turquia e alguns asiáticos, como Índia, China, Indonésia, Hong Kong, Taiwan e Coréia do Sul.
O valor das exportações americanas para esses países já excede o valor exportado para a União Européia e o Japão. Nos próximos dez anos, estão previstos investimentos de mais de US$ 1,5 trilhão em aeroportos, sistemas de telecomunicações e energia.
O Brasil tende a diferenciar-se nesse conjunto em virtude do tamanho e das perspectivas de sua economia, das mudanças em curso na sociedade e da consolidação da democracia, que tende a acelerar as mudanças e reforçar o avanço institucional.
No confronto com seus principais concorrentes na atração dos capitais, o Brasil ganha em previsibilidade, em estabilidade social e política e em perspectivas econômicas.
É crescente, por outro lado, o conhecimento de nossas complexidades e das razões da demora nas reformas.
Tantas novidades geram muita confusão. Há quem pense que todos os estrangeiros com aplicações no mercado financeiro brasileiro são abomináveis especuladores. É um monumental equívoco.
Em suma, os investidores sabem que há muitos riscos e oportunidades. A menos que percebam que fracassaremos nas reformas, continuarão a apostar no Brasil. A reversão do atual quadro do mercado acionário pode ser mera questão de tempo.

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