São Paulo, sábado, 30 de agosto de 1997
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S.O.S. turismo

HENRIQUE EDUARDO ALVES

A conta-turismo no Brasil tem sido extremamente deficitária e, neste ano de 1997, deverá atingir seu pior desequilíbrio. Mantida a tendência verificada até agora, deveremos chegar a dezembro com um "déficit" de US$ 3 bilhões, resultante de aproximadamente US$ 6 bilhões gastos por brasileiros no exterior contra menos de US$ 3 bilhões gastos por turistas estrangeiros no Brasil.
A causa fundamental e indiscutível desse monumental descalabro é o alto custo das tarifas aéreas nacionais, quando comparado com o praticado nas principais economias do mundo.
Você hoje pode sair do Rio ou de São Paulo para Cancún ou Miami, ao norte, para Buenos Aires ou Santiago do Chile, ao sul, a preços mais baixos e em condições de pagamento e de juros mais satisfatórias que as oferecidas para o Nordeste brasileiro. Além disso, viajar ao exterior dá status, proporciona emoções fortes, com línguas, costumes e culturas diferente, e, de quebra, disponibiliza o "free shop", para reacender o impulso consumista e até gerar um "plus" para cobrir parte das despesas.
Com todo esse apelo e esse favorecimento para fora, o fluxo para o exterior cresceu 200% nos últimos dez anos, enquanto o fluxo para o Nordeste caiu cerca de 20% no mesmo período.
Cabe lembrar que, graças às boas perspectivas que o turismo interno apresentou no início da década de 80, verificou-se uma grande mobilização do empresariado rumo à hotelaria e ao turismo do Nordeste, acarretando a implantação de excelentes pólos de hospedagem e lazer.
Estima-se que o Nordeste disponha hoje de aproximadamente 2.300 hotéis e pousadas, oferecendo mais de 50 mil quartos, com 120 mil leitos e representando investimentos de mais de R$ 2 bilhões.
Pois bem. Todos esses equipamentos turísticos, que, se bem utilizados, poderiam gerar perto de 1 milhão de empregos diretos e indiretos, ficam, devido à crise das tarifas, operando no vermelho, gerando desemprego e remunerando insuficientemente os pesados capitais investidos.
Os níveis médios de ocupação dos hotéis têm se situado em torno de 50% ao ano, quando, na realidade, deveriam estar acima dos 70%, para possibilitar a boa saúde financeira das empresas e para permitir a elas investir na atualização e na modernização desses equipamentos.
Para reverter essa situação, é indispensável e inadiável uma ação enérgica do governo no sentido de desregulamentar todo o setor da aviação civil, induzindo-o e expondo-o às condições de modernidade, competitividade e flexibilidade que o mercado requer.
Sabe-se que o presidente Fernando Henrique Cardoso criou recentemente um grupo de trabalho, coordenado pelo ministro Clóvis Carvalho, do Gabinete Civil, e composto por representantes do DAC, da Embratur e do Ministério da Fazenda, para estudar detidamente a crise do transporte aéreo no Brasil e propor ações reparadoras.
Congratulo-me com o presidente por essa demonstração de disposição de atacar os pontos críticos do problema, entre os quais destaco os que reputo de maior urgência e prioridade:
1) Diversificar os preços das passagens aéreas, montando fórmulas que permitam atender aos mais diferentes tipos de interesses, como estudantes, terceira idade, trabalhadores etc. (enquanto no Brasil temos até cinco tarifas num mesmo vôo, nos EUA esse número chega a até 20 tarifas).
2) Promover gradualmente a abertura do mercado interno para empresas estrangeiras, proporcionando, entretanto, condições de competitividade às empresas nacionais.
3) Flexibilizar e incentivar o desenvolvimento dos vôos "charter", por intermédio de empresas sólidas e competentes, que ofereçam tarifas e serviços mínimos, mas com o máximo de segurança em vôo.
4) Iniciar o processo de privatização de alguns serviços aeroportuários, hoje em regime de virtual monopólio pela Infraero.
4) Criar mecanismos de eliminação de pontos críticos na estrutura de custos de nossas passagens, para torná-las competitivas com as de outros destinos (com atenção especial para gastos com pessoal, combustível, impostos, câmbio e despesas comerciais).
5) Estabelecer linhas de financiamento para passagens e pacotes turísticos destinados ao mercado interno competitivas com as disponíveis para viagens ao exterior.
Todas essas medidas e muitas outras, não mencionadas, terão de ser implementadas com determinação e urgência já a partir deste ano, para tentarmos rearrumar a economia do Nordeste e estancar a vergonhosa sangria da nossa balança do turismo.
Aos parlamentares, governadores, políticos em geral e à sociedade civil, cabe vigiar e lutar para que essas providências sejam prontamente postas em prática e para que a reversão dessa situação dramática inicie-se imediatamente.

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