São Paulo, sábado, 30 de agosto de 1997
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Salão mostra o lado social do humor

Evento criado como meio de protesto sob censura

PEDRO CIRNE DE ALBUQUERQUE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Começa hoje a 24ª edição do Salão de Humor de Piracicaba, que surgiu em 1974 como um meio de resistência ao regime militar então vigente no Brasil.
A abertura para o público da edição de 1997 começa às 20h de hoje, com o ator e humorista Luiz Fernando Guimarães comandando a apresentação dos vencedores e as homenagens deste ano, que vão para Miécio Café e para o quadrinhista argentino Rodolfo Zalla.
Estarão expostos 260 trabalhos, selecionados entre os cerca de 1.300 desenhos enviados por artistas de cerca de 50 países.
Os 540 artistas que mandaram seus trabalhos concorrem nas categorias cartum, charge, caricatura e quadrinhos. O primeiro e o segundo colocados de cada categoria receberão um total de US$ 12 mil.
Como aconteceu no ano passado, haverá também o "Prêmio Internet". Uma comissão do salão selecionou seis trabalhos e os colocou na rede virtual para que os internautas decidam qual é o melhor trabalho do ano -o vencedor leva US$ 2.000 em dinheiro.
24 anos
Os jornalistas Alceu Marozi Righeto, Carlos Marcos Colonese e Adolpho Queiroz conceberam a idéia de um salão de humor em Piracicaba em 1974.
Para viabilizar o salão, a trinca de jornalistas convidou o cartunista Zélio Alves Pinto, que tinha contato com os artistas do jornal revolucionário "Pasquim".
Zélio foi ao Rio para convencer Jaguar, Millôr Fernandes, Ziraldo e Fortuna, entre outros, a participar da estréia do salão.
"O 1º Salão foi uma homenagem ao 'Pasquim'. Os cartunistas eram soldados contra o sistema, que tinham uma liberdade vigiada. O salão surgiu por um fator muito mais político do que cultural", conta Zélio, que hoje é presidente de honra do Salão e secretário-adjunto de Cultura do Estado.
No primeiro ano da mostra, a censura foi o tema da maioria das charges inscritas.
A charge vencedora do primeiro ano, de Laerte Coutinho, mostra um menino sendo torturado e gritando: "O rei estava vestido!", uma alusão à fábula dos irmãos Andersen em que o menino grita: "O rei está nu" e é aclamado pelo povo.
"O cartum tem a possibilidade do duplo sentido, da mensagem metafórica. Ele tinha um contexto nacional muito grande naquela época, em tempo de convivência com a censura", conta Zélio.
O Salão se tornou internacional já em sua segunda versão, em 1975. Zélio diz que a internacionalização também teve motivos políticos.
"Naquela época havia uma perseguição contra os cartunistas, e a prisão aqui era perigosíssima. Ninguém aqui podia ser preso, principalmente se a mídia não fosse informada. Mas os nossos jornais estavam sob censura. Com a internacionalização, a prisão de qualquer um seria noticiada fora do país. Isso não garantia a liberdade dos artistas, mas, pelo menos, a sua integridade física."
Bodas de prata
Nas obras enviadas neste ano, um novo tema foi bastante abordado pelos chargistas: a morte do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.
Os outros assuntos dominantes marcaram presença em todos os anos do festival, segundo Zélio: as guerras, as relações econômicas mundiais e o universo político brasileiro.
O Salão chega à 25ª edição no ano que vem. Para a comemoração de suas bodas de prata, está sendo criado, desde o ano passado, o Cedhu (Centro de Pesquisa e Documentação do Humor).
As principais funções do centro serão manter o acervo dos 24 anos do evento -que possui mais de 300 originais-, cuidar da realização do salão, orientar um centro de pesquisa, promover workshops e gerar o Festival de Teatro de Rua e a Feira de Literatura Infanto-Juvenil e Multimídia.

O quê: abertura para o público do 24º Salão Internacional de Humor de Piracicaba Quando: hoje, às 20h
Onde: Teatro Municipal de Piracicaba (r. Gomes Carneiro, 1.212, Piracicaba, tel. 019/433-4952 ou 434-2169)
Quanto: entrada franca

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