São Paulo, domingo, 31 de agosto de 1997
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Ex-miss desafia 'caciques' na Venezuela

RODRIGO BERTOLOTTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Brasil, Equador, Colômbia e Paraguai também terão eleições presidenciais em 1998, mas em nenhum desses países deve haver uma campanha com candidatos com passados como os que concorrem na Venezuela.
Entre os mais de 15 pré-candidatos estão a Miss Universo 1981, Irene Sáez, e o tenente-coronel retirado Hugo Chávez Frías, líder do frustrado golpe de Estado de 1992.
Mas Chávez, com apoio de pequenos partidos de esquerda, não chega nem perto dos 40% de intenção de votos de Sáez, que é prefeita de Chacao (Grande Caracas).
Aproveitando o desgaste dos partidos tradicionais (90% dos venezuelanos dizem não mais acreditar neles), a loira Sáez se lança à campanha apoiada pelo movimento Integração, Renovação e Nova Esperança, cuja sigla é Irene.
A Venezuela é a democracia mais estável da América do Sul, chegando em 1998 a seu 40º ano de vida.
Nesse período, funcionou um bipartidarismo que revezou no poder o Copei (Comitê de Organização Política Eleitoral Independente, centro-direita) e a AD (Ação Democrática, centro-esquerda).
Desses, apenas a Ação Democrática já perfila um candidato. É Claudio Fermín, carismático líder social-democrata que é uma espécie de herdeiro de Carlos Andrés Pérez, presidente deposto após impeachment em 1993.
Por outro lado, setores do Copei querem engolfar a candidatura de Sáez, enquanto outros resistem.
90-60-90
Mas a polêmica em torno do chamado "fenômeno Sáez" envolve toda a sociedade, não só o Copei.
"Irene cultiva o enigma e o silêncio. Sua comunicação não se baseia em palavras, mas em gestos, sinais e indícios que o povo interpreta. Ela é mágica", afirma o intelectual Diego Bautista Urbaneja.
A opinião do analista político venezuelano Manuel Caballero é bem diferente. "A mágica são os números 90-60-90. Sua impressionante estatura, a cabeleira leonina e o sorriso de propaganda estão domando os venezuelanos."
Os opositores de Sáez dizem que ela não tem experiência para ser presidente e que fazer um bom governo em Chacao é fácil, afinal, a população de lá é quase toda de classe média e alta.
Na verdade, Chacao é uma ilha de prosperidade em um país que viveu a bonança do petróleo nos anos 70, mas que, a cada ano, vê seus índices sociais piorarem.
Na cidade de Sáez, foram criados serviços públicos que seriam considerados de luxo, como aula de tai-chi para idosos, atendimento médico domiciliar, duas orquestras e uma escola de balé.
Enquanto o resto de Caracas tem problemas de tráfego e de coleta de lixo, os policiais de trânsito, com uniformes cáqui e capacetes brancos, e os lixeiros, com roupas esporte, cuidam do município apelidado de "Irenelândia".
Sáez foi eleita prefeita em 1992, com 70% dos votos, e reeleita com 96% do eleitorado, em 1995.
O prédio da prefeitura que ocupa atualmente dista dois quarteirões da edificação onde se preparam todas as misses do país.
A Venezuela é a vice-líder mundial na produção de Miss Universo, com quatro títulos -perde somente para os EUA, os inventores desses concursos, que têm sete.
Falta muito para a eleição de 4 de dezembro de 1998, mas a história local já guarda um exemplo de beldade que se deu mal na política.
Nas eleições de 1958, o contra-almirante Wolfgang Larrazábal, amparado em sua boa aparência e conclamações ao estilo "minha gente", era o mais popular dos candidatos. Quando as urnas foram abertas, o eleito foi Rómulo Betancourt, da AD, o inaugurador do ciclo democrático que sobreviveu à onda de ditaduras que varreu a América Latina nos anos 60 e 70.

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