São Paulo, sexta-feira, 5 de setembro de 1997
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'Caça às Borboletas' celebra monotonia

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Hitchcock dizia que o drama é a vida sem as partes chatas. Só para contrariar, o russo Otar Iosseliani fez um filme só com as partes chatas: "Caça às Borboletas".
No interior da França, duas primas que já passaram dos 70 anos vivem juntas num velho castelo.
A primeira parte do filme narra o dia-a-dia inusitado: uma delas toca trombone e pesca com arco e flecha no lago; a outra pratica tiro ao alvo com um revólver e faz amizade com jovens Hare-Krishna.
Na segunda parte, com a morte da mais velha delas, Marie-Agns (Thamar Tarassachvili), dona do castelo, há uma reviravolta: chega uma irmã da falecida, e empresários compram a propriedade.
Há ainda um sem-número de personagens secundários: um padre beberrão, um marajá indiano etc. Parece um filme movimentadíssimo, mas não é.
Avesso, segundo diz, aos mecanismos hollywoodianos de projeção e identificação do espectador com os personagens, Iosseliani filma tudo com o mesmo distanciamento desdenhoso (o enquadramento que mais aprecia é o plano de conjunto).
Cria, assim, uma barreira entre o público e o drama, circunstância agravada pela dublagem (intencionalmente?) ruim dos diálogos.
Não existe ênfase nem mudança de ritmo. Tudo é filmado como se fosse o que Barthes chamava de "catálise", ou ponto de ligação entre os momentos dramaticamente fortes (que nunca chegam).
Os planos são sempre lentos, mas sem tensão. Uma receita para a monotonia, em suma.
Claro que há coisas interessantes, sobretudo a idéia central de deslocamento. Todo mundo -russos, japoneses, indianos, jovens, velhos- parece estar fora do lugar, e a própria vida se desenvolve de modo errático, aos tropeços.
O difícil é manter-se acordado para perceber isso.

Filme: Caça às Borboletas
Produção: França/Alemanha/Itália, 1992
Direção: Otar Iosseliani
Com: Narda Blanchet, Thamar Tarassachvili, Alexandra Liebermann
Quando: a partir de hoje, no Estação Vitrine

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