São Paulo, sábado, 6 de setembro de 1997
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Especialistas fazem críticas a maiores poderes para CCJ

Emenda permite que comissão quebre sigilos fiscal e bancário

CLÁUDIA TREVISAN; EUNICE NUNES
DA REPORTAGEM LOCAL

Especialistas ouvidos ontem pela Folha criticaram a proposta de emenda constitucional que amplia os poderes de investigação das CCJs (Comissões de Constituição e Justiça) da Câmara e do Senado sobre parlamentares sujeitos a processos de cassação do mandato.
Para alguns deles, a proposta é inconstitucional. Para outros, o Congresso já conta com amplos poderes de investigação por meio das CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito).
A criação de mais uma instância nos moldes da CPI poderia quebrar a coerência do sistema investigativo do Congresso, observam alguns dos especialistas.
A emenda que amplia os poderes de investigação sobre os parlamentares foi aprovada pela CCJ da Câmara anteontem. A proposta é de autoria do deputado Marcelo Déda (PT-SE).
"Isso me parece uma ingerência nas atividades da CPI", afirma o ex-presidente da seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) José de Castro Bigi.
Segundo ele, a concessão de amplos poderes às CCJs pode resultar em abusos.
Cláusula pétrea
O advogado criminalista Arnaldo Malheiros Filho concorda: "Acho perigoso, porque a CCJ é um foro pouco representativo". Em sua opinião, a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico dos parlamentares deveria ser aprovada pelo plenário.
Esse tipo de sigilo é um dos direitos e garantias individuais previstos na Constituição, diz o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Por essa razão, ele considera inconstitucional a proposta de emenda.
Mariz lembra que a Constituição proíbe, em seu artigo 60, a apresentação de emendas que tenham por objetivo suprimir cláusulas pétreas, entre as quais se incluem os direitos e garantias individuais.
O conselheiro federal da OAB João Piza acredita que a emenda poderá ser considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, se vier a ser aprovada.
"Há precedentes no Supremo que declaram inconstitucionais emendas à Constituição", diz.
Na opinião de Piza, a proposta aprovada também representa uma invasão no âmbito de atuação das CPIs, o que violenta a coerência do sistema legislativo.
CPI sem restrições
O professor de direito comercial da USP Fábio Konder Comparato afirma que o importante é que o funcionamento das CPIs não seja restringido por disposição interna do Congresso Nacional.
Comparato considera inconstitucionais limitações que existem atualmente. Entre elas, o professor cita a proibição de funcionamento simultâneo de mais de cinco CPIs.
"Isso estava na Constituição dos militares. A atual não impõe qualquer limite quanto ao número de CPIs", diz Comparato.
A favor
Miguel Reale Jr. e Celso Bastos não vêem problemas na ampliação de poderes da CCJ. "Acho a proposta absolutamente conveniente", afirma Reale, que é professor de direito penal da USP.
Com a medida, o Congresso poderá fazer investigações sobre os seus membros sem precisar recorrer ao Judiciário para obter quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico, acrescenta. Bastos, professor de direito constitucional da PUC-SP, diz que a emenda não contraria a Constituição.
"A proposta simplesmente estende a outros órgãos atribuições que já são do Poder Legislativo."
Mas Bastos não vê a proposta de emenda aprovada na CCJ com simpatia. "Não acredito que ela esteja na ordem de prioridades dos problemas nacionais."
(CLÁUDIA TREVISAN e EUNICE NUNES)

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