São Paulo, domingo, 7 de setembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Vida de Diana caminhava para o sórdido

DA SALON MAGAZINE

Junto com milhões de outros norte-americanos, Camille Paglia ficou acordada na noite de 1981 para assistir o casamento de contos de fada de Diana Spencer com o futuro rei da Inglaterra.
Em 1992, ela escreveu um ensaio sobre "Diana, a caçadora" para a revista "New Republic" (reimpresso em seu livro "Vamps e Vadias"), que o cronista da família real Andrew Morton congratulou como a "primeira análise séria sobre o crescente significado cultural da princesa". No ano seguinte, Paglia apresentou um respeitoso especial sobre Diana no Channel 4 britânico, quando os formadores de opinião viam a princesa como alguém de "cabeça vazia".
Na última semana, Paglia grudou à TV novamente, mudando sem parar de canais, para assistir todos os boletins e os infindáveis "replays" do acidente em Paris. Em entrevista terça-feira, Paglia comentou a morte de Diana.
Pergunta - Na sua essência, qual era o "appeal" da princesa Diana?
Paglia - Ela era um novo tipo de mulher, que apareceu quando o feminismo tinha redefinido as mulheres simplesmente como profissionais, brancas, de classe média alta, com uma maleta de executiva. O appeal vinha do seu frescor, feminilidade, desejo pelo casamento e por filhos.
Pergunta - Quão importante era o seu glamour? No início, ela parecia apenas uma estudante estabanada.
Paglia - Ela se comunicava com seu corpo. Ela conseguiu fazer com que o mundo se apaixonasse por ela unicamente por causa de sua linguagem corporal. Ela foi treinada como uma bailarina, o que notamos em seus movimentos, na sua graça e estilo, saindo de carros ou ficando fantástica nas roupas. Nós a observamos evoluir rapidamente, de um botão de rosa, tímida e de cara-lavada, para uma sofisticada rainha.
Pergunta - O patinho feio virou cisne?
Paglia - Sim e a imprensa tornou-se sua aliada contra o establishment britânico. Ela foi banida pelos burocratas e pela Casa de Windsor e se virou para a mídia para expor suas opiniões e sua personalidade. O palco mundial da mídia tornou-se sua via de expressão.
Pergunta - Mas pagou-se caro.
Paglia - Sim, ela deixou o gênio sair da garrafa, mas depois ele a devorou e a conduziu para esse desastre. Ela entrou numa espiral fora de controle. Isso aconteceu nos últimos anos, quando assistimos várias decisões erradas -um dos maiores foi confiar sua vida e sua segurança a esse traste do Dodi Al-Fayed e a pessoas a seu redor, todos completos idiotas.
Pergunta - Enquanto Diana mudava, seus pensamentos sobre ela também mudaram?
Paglia - Sim. Eu acreditava que ter aceitado a responsabilidade de ser a mãe do futuro rei da Inglaterra tornava impossível que a realização pessoal fosse um de seus objetivos. Comecei a sentir que havia algo artificial nos seus atos de caridade. Ela tinha um toque genuinamente humano em relação às pessoas e, quando ela embarcava nessas missões de compaixão, parecia que as sentia verdadeiramente. Mas, com o tempo, acho que houve uma crescente representação -e desespero- nesse oba-oba em que estava envolvida.
Pergunta - O que ela deveria ter feito de maneira diferente?
Paglia - Uma vez separada de Charles, ela poderia ter se livrado da mídia optando por um estilo de vida mais reservado. O mundo continuaria interessado, mas não haveria essa obssessão louca. Talvez, ela tenha achado que poderia parar com esse frenesi da mídia, apenas dizendo: "Ok, para mim chega". Ela começou a desperdiçar seu grande dom. Uma vez, ela disse que um trabalho que a realizasse era melhor que esperar por um homem que desse significado à sua vida. Eu preferia que ela tivesse seguido a primeira opção, porque este é um final de muito mau-gosto -morrer num carro de um gigolô playboy que saía voando do Ritz.
Pergunta - Os tablóides, como disse o irmão de Diana, estão mesmo com as mãos sujas de sangue?
Paglia - Eu não vejo assim. Foi pelos tablóides que o mundo se apaixonou por ela. Sim, fiquei muito contente em saber que um paparazzi apanhou de transeuntes e espero que eles sejam julgados por assassinato. Mas eu acho que também há sangue nas mãos da Casa de Windsor, da família real aos burocratas, que não perceberam ter em mãos essa incrível jóia da coroa, que trouxe a monarquia para o presente. Com Diana, a monarquia restaurou sua modernidade. A enorme perda de prestígio e de confiança das pessoas na monarquia provém diretamente do tratamento dado pelos "reais" a ela. Eles foram ridículos.
Pergunta - E o cavaleiro numa armadura brilhante, Dodi Al-Fayed?
Paglia - Todos queriam ver Diana feliz, mas estava claro que ela nunca achou dentro de si mesma a fonte de sua sobrevivência. No final, sua vida parecia caminhar para o sórdido. E você não pode culpar os tablóides por isso.

Texto Anterior: Diana reúne dramas de mulher
Próximo Texto: Homem no pedaço
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.