São Paulo, sexta-feira, 12 de setembro de 1997
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A sorte que sempre acompanhou Emerson

JAN BALDER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Domingo à noite recebo um telefonema da rádio. Emerson Fittipaldi estava desaparecido com o seu ultraleve.
Pensei comigo: no chão ele se safou de todas. Agora pode ser muito sério. Respondi, vamos torcer pelo melhor, mas minha grande preocupação durou cinco minutos.
O tenente Calazans, do Corpo de Bombeiros de Araraquara, entrou no ar e declarou que Emerson e seu filho Luca haviam sido encontrados a salvo.
Bárbaro, adjetivo que ele usa frequentemente.
Segunda-feira pela manhã, fui para o hospital Albert Einstein, onde Emerson já se encontrava para exames. Lá, seus pais, sempre unidos, ao lado dos filhos.
A mão, Dona Juze, ainda angustiada, com o coração fraco, olhos arregalados, ansiosa pelo resultado dos exames de seu filho mais novo.
Emerson, na infância, sempre foi seu xodó. Ela controlava todas suas ações, e Emerson, sempre se justificando. Um belo dia, ele fora correr escondido de moto em Interlagos. Dona Juze descobriu e, de vassoura na mão, "limpou" Emerson dos boxes.
Senhor Wilson, pioneiro na transmissão de corridas e criador da mais importante prova brasileira, as Mil Milhas, estava mais tranquilo.
Wilsinho, outro calejado. Quando garotos, choramos muito em sua casa a morte do piloto Christian Heins -não foi de graça o nome de seu primeiro filho.
Na Fórmula 1 dos anos 70, a média de acidentes fatais era de um por ano. Ele mesmo, disputando freada, assistira, ainda pela Fórmula 2, em Tarumã, Giovanni Salvatti morrer debaixo do guard-rail.
No hospital, todos nós estávamos despistando, falando de outros assuntos e lembrando coisas boas do passado.
Olhando pela janela, lembrei-me que na adolescência Emerson "descobrira" uma pista entre tantas outras, com um traçado em forma de "oito", no Morumbi, exatamente onde hoje se encontra o hospital Albert Einstein.
Em um de nossos "pegas" -Emerson com uma moto Mondial e eu com uma Leonette-, ele abriu vantagem e, quando entrei numa curva, vi ele deitado, moto caída, no meio do mato, cheio de galhos.
Joguei minha moto no chão para socorrer meu amigo. Pensei que ele chorava, mas ele ria muito. Era tudo simulação.
Agora era sério.
Quando Emerson voltou para o quarto, após os exames realizados, a primeira coisa que quis saber foi do estado do seu filho Luca, que saíra milagrosamente ileso.
Emerson sempre me chamou a atenção pelo seu equilíbrio. Desta vez, estava assustado. Perdera o comando do ultraleve a 100 metros de altura, sem muro, sem guard-rail ou caixa de brita, mas com um brejo que amorteceu o impacto.
Nosso amigo em comum, Eugenio Martins, desde quando éramos garotos dizia: "Para se vencer é preciso três ingredientes: sorte, sorte e mais sorte".
E isso nunca faltou a Emerson Fittipaldi, nosso primeiro campeão mundial de automobilismo.

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