São Paulo, domingo, 21 de setembro de 1997
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Solução caseira é melhor remédio contra vício

GILBERTO DIMENSTEIN

Por que a maioria das pessoas que usa drogas durante a adolescências não se vicia?
Se todos aqueles que experimentaram drogas em seus tempos universitários caíssem no vício, a elite brasileira econômica e intelectual brasileira estaria em vias de extinção.
Nem o presidente se chamaria Fernando Henrique Cardoso. Certamente o comando da política econômica estaria em mãos diferentes.
Depois da turbulência da adolescência, a imensa maioria leva vida normal, começa a trabalhar e se casa.
Em breve, repetem com os filhos os medos, angústias e sermões que ouviram dos seus pais.
Um pedaço da resposta (talvez o mais importante) da questão que abre essa coluna dessa questão está na mais ampla investigação já realizada sobre a relação dos jovens com drogas, bebidas e violência.
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Universidades americanas receberam dinheiro do governo federal para entrevistar 110 mil jovens e 18 mil pais.
Esse gigantesco material começa, agora, a ser analisado por psicólogos, psiquiatras, educadores, médicos, preocupados com a montagem de programas preventivos. Os primeiros resultados saíam na semana passada.
Para dar apenas um número da gravidade do problema: aqui, todos os anos 110 mil jovens experimentam heroína.
Já são 600 mil viciados apenas em heroína, uma droga que voltou à moda nos EUA e contamina Europa e América Latina.
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A moda é tão forte que criou um padrão de beleza. Manequins cadavéricas, com olhos fundos e olhar perdido, vendem roupas de grife. É o que se batizou de "heroína chique".
Natural, portanto, o pânico nas famílias. A indústria da moda está apanhando de todos os lados. Assim como os músicos, cineastas e artistas plásticos que insinuem qualquer aceitação às drogas.
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Das entrevistas sai, porém, a indicação de que o melhor remédio contra o vício está em casa.
Os pesquisadores encontraram uma íntima relação entre o contato afetivo dos filhos com os pais e os distúrbios.
Quanto maior a ligação emocional na família, menor a chance de envolvimento com drogas, bebida, suicídio, sexo promíscuo e violência.
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Ao contrário do que se divulga com frequência, segundo a pesquisa, tanto faz que os pais sejam separados.
Essencial é que mantenham contato permanente e afetivo com os filhos.
Como a maioria dos presos americanos vêm de famílias desestruturadas, desenvolveu-se a tese de que a barriga da mãe solteira, especialmente pobre, é o caminho mais curto para produzir um marginal.
O problema, no caso, não é o tamanho da família, mas os laços afetivos com referências positivas. O charme das gangues é justamente oferecer um ambiente de aceitação e até hierarquia. Ou seja, uma família.
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A investigação mostra que o envolvimento emocional com os professores também é um antídoto contra a delinquência.
Não é à toa que os programas de tutoria, disseminados aqui, dão tanto resultado -o tutor faz o pai do pai, mãe, tio ou irmão mais velhos.
"Vi jovens desabrocharem", afirma Gisela Queiroz, uma bailarina do Paraná, estudante da Faculdade de Educação da Universidade de Nova York. Como parte de seus estudos, Gisela é tutora de jovens em Chinatown e desenvolve as artes, em especial a dança, como isca afetiva.
Ela faz parte do mais avançado centro de estudos dos EUA sobre violência nas escolas, comandado pelo professor John Divine. "Chego às escolas e peço os que são considerados os mais terríveis alunos. Quando eles se sentem aceitos e respeitados, aprendem o valor do progresso profissional e valorizam a escola."
O centro comandado por John não é apenas um recanto acadêmico, mas promove programa nas escolas para a prevenção de violência, formando tutores. Começa, agora, a transferir as descobertas a educadores brasileiros.
"Quando eles se apegam a um valor positivo, começam a mudar de comportamento. Esse apego apenas se dá através da troca afetiva", afirma Gisela.
Tradução: os pais e educadores devem se preocupar mais consigo próprios do que os traficantes que rodeiam suas casas e escolas.

Está traduzido para o português o detalhamento da pesquisa patrocinada pelo governo americano com os jovens. Endereço: www.aprendiz.com/.

PS- Ótima notícia. Num gesto pioneiro, a Câmara dos Deputados aprovou semana passada projeto determinando implantação de aulas de direitos humanos nas escolas brasileiras. A autoria é do deputado José Aníbal (PSDB-SP). Medidas como essa, se bem aplicadas, mudam a mentalidade de um país.

Fax: (001-212) 873-1045

E-mail: gdimen@aol.com

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