São Paulo, segunda-feira, 22 de setembro de 1997
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Jean NOUVEL

Arquiteto francês mostra com quanta luz se faz um projeto

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O arquiteto Jean Nouvel está hoje em São Paulo para inaugurar uma mostra audiovisual de sua produção e ministrar, amanhã, uma aula magna no teatro Faap.
Considerado o mais importante arquiteto francês da atualidade, é responsável pelos projetos do Instituto do Mundo Árabe, Fundação Cartier e Torre sem Fim (todos em Paris), além de edifícios em toda a Europa e Ásia. Em entrevista por telefone à Folha, de Paris, Nouvel falou de sua opção por uma arquitetura da especificidade, do arquiteto como homem do real e de sua fixação pela luz.
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Folha - Você acredita que a arquitetura deve mirar uma cultura e uma história regional ou deve procurar um estilo internacional?
Jean Nouvel - Você deve saber que eu sempre tentei ser o arquiteto da especificidade. Não acredito em nenhuma solução que não seja particular e sempre procurei manifestar uma reação forte contra o estilo internacional, em que um mesmo modelo era reproduzido em todas as cidades do mundo.
Também sou totalmente contrário à escola de belas-artes e à noção de uma arquitetura unicamente condicionada ao belo desenho, sem nenhum conceito ou idéia por trás.
Também não acredito muito na existência hoje de um estilo regionalista. Mesmo que existam heranças, como o uso de materiais e tipologias de edifícios, acredito que a arquitetura mudou seu sentido. Ela se tornou uma disciplina autônoma, na qual não é possível mais aplicar velhas receitas.
Folha - Quais são as limitações da arquitetura? A normatização técnica dos materiais, a ecologia, o contexto histórico-cultural do local?
Nouvel - A arquitetura será sempre limitada por um contexto, pois se trata de uma disciplina do real. Existem limites econômicos, políticos, de segurança, mas é nesse sistema de opressões que é necessário encontrar as soluções.
Acho que, para as grandes cidades e para os problemas da ecologia, não encontraremos saídas que não venham por meio da criatividade, da utilização de materiais econômicos e adequados. Só assim poderemos fazer uma arquitetura que não pertença apenas a uma elite.
Folha - Como você conseguiu conciliar sua formação ocidental às exigências árabes para o projeto do Instituto do Mundo Árabe?
Nouvel - O Instituto do Mundo Árabe é um edifício ocidental dedicado à cultura árabe. Era preciso que eu traduzisse os conceitos dessa cultura. A grande arquitetura árabe se baseia em geometria e luz, os dois conceitos sobre os quais trabalhei.
Folha - Foi seu trabalho mais difícil?
Nouvel - Foi um trabalho muito difícil porque estava localizado em uma região histórica de Paris. Era um projeto complexo, pois 20 países faziam parte do Instituto do Mundo Árabe, e era necessário um consenso entre eles.
Folha - Você citou a luz, uma característica constante em seu trabalho, que se repete no prédio da Ópera de Lyon, na Fundação Cartier... Você tem alguma fixação pela luz, principalmente a natural?
Nouvel - A modernidade nos trouxe novidades que transformaram a arquitetura. Hoje, o que caracteriza a modernidade é a evolução do material, que se tornou uma espécie de darwinismo.
Folha - Esse uso da luz natural me parece uma forma de nostalgia de uma vida mais aberta, em contato com a natureza...
Nouvel - Não sinto isso como uma nostalgia, mas como a manifestação de uma arquitetura da abertura, do contato com os outros, da expressão da vida, da integração com a natureza e com a luz.
Nouvel - Grande parte de sua carreira foi construída durante o governo socialista de Mitterrand. Você acredita que seria possível fazer o mesmo tipo de trabalho sem um governo socialista?
Nouvel - Acredito que o que caracterizou o governo de Mitterrand foi a opção de um presidente que aceita representar o poder oficial por meio de uma modernidade, mas essa não é uma característica socialista. O socialismo aqui não se compara ao socialismo dos países do Leste. Tratou-se de uma opção cultural que se adequava a uma situação política.
Folha - Não é difícil desenvolver a arquitetura com criatividade quando se deve estar ao lado do Estado e do poder econômico?
Nouvel - O arquiteto é alguém que deve fazer escolhas realistas. Não é um artista, como um músico ou um pintor, que se expressa em frente a uma folha de papel em branco e que é livre. O arquiteto é oprimido por uma série de circunstâncias. Ele é obrigado a compor com o outro. A arquitetura tem que resolver questões sociais.

Evento: Exposição Jean Nouvel
Onde: salão cultural da Faap (r. Alagoas, 903, Pacaembu, tel. 011/824-0233) Vernissage: hoje, às 20h (para convidados)
Quando: de segunda a sexta, das 11h às 21h; sábado e domingo, das 12h às 18h. Até 5 de outubro
Quanto: entrada franca

Evento: aula magna de Jean Nouvel
Onde: teatro Faap
Quando: amanhã, às 10h
Quanto: entrada franca

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