São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 1997 |
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Primeiro solo de Lenine é 'mistura'
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
Após duas parcerias ("Baque Solto", com Lula Queiroga, e "Olho de Peixe", com Marcos Suzano), ele, sozinho, está mais pernambucano e universal que antes. "Moro no Rio de Janeiro desde os 17 anos e isso reflete na maneira como componho. A sensação de despatriamento é um subterfúgio para exercitar a composição cosmopolita", diz. Antes apaixonado por rock progressivo e pelo clube da esquina mineiro, Lenine se aproxima dos sons tipicamente brasileiros, agora alicerçados em samplers e recursos tecnológicos. Ele explica o design espacial e samplers futuristas de "O Dia em Que Faremos Contato": "Ficção científica é minha grande paixão. Minha referência não é a música, mas a imagem em movimento, o cinema, as histórias em quadrinhos. Sou cineasta frustrado". "Movimento" "Até há algum tempo havia muito gueto no cenário musical, o funk, o rock, a MPB no seu pedestal, o samba. Eu transitava por vários desses estilos, mas nunca fui de participar de gueto. Por isso fui compor." Para ele, tudo mudou. "Acho que o Brasil nunca andou tão bem das pernas. O abismo começou a ruir com a tecnologia -e a perda do medo dela pelos artistas brasileiros- e aí se descortinou um universo interessante. Foi Chico Science quem propiciou isso ao Brasil." O conterrâneo Science, embora tenha lançado seu trabalho "afrociberdélico" em primeiro lugar, é tido por Lenine mais como um contemporâneo que como influência. "Sua crônica, do hip hop com baixas frequências do maracatu, é parecida com a de Planet Hemp, O Rappa, Daúde, Mundo Livre (que tem resolução sonora mais inusitada). Foi preciso acontecer Chico Science, Fernanda Abreu, para a música popular poder viver isso." "Ao mesmo tempo que adoro Beck, Ben Harper e David Mathews Band, sei que não existiria Chico Science sem Alceu Valença, que não existiria sem Capiba. Foi necessário uma revolução para que se viesse a tocar música do Brasil no Brasil." Ele diz ter horror à palavra "movimento", mas admite que uma movimentação espontânea pode ser detectada no Brasil dos 90. "Onde vou há gente nova -Pedro Luís, Arícia Mess, Boato-, todos no mesmo processo, todos cronistas da época, individuais e individualistas", diz. "Todos têm na integridade o elo que faltava para unir as ilhas. É o que quero dizer em 'A Ponte': somos um grupo de ilhas cercadas de pontes por todos os lados. É aqui que acontece a mistura." Concluindo, faz um apelo a seu consumidor: "Gostaria de pedir às pessoas que ouvissem o disco bem alto, com som na caixa. É um disco de 'paudurescência' ". Texto Anterior: "#2" mostra Daúde melancólica Próximo Texto: "O Dia em que Faremos" se rende à tecnologia Índice |
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