São Paulo, sábado, 27 de setembro de 1997 |
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'Terra Estrangeira', o livro, serve de memória da retina Lançamento da Relume Dumará reúne fotogramas do filme EDER CHIODETTO
As imagens do filme saltaram da tela de cinema, se projetaram sobre o papel e se transformaram num livro de 112 páginas com 287 reproduções de fotogramas do filme. Uma imagem estática se desprendeu do papel, ganhou velocidade e virou cinema. Agora são as imagens em movimento que, paralisadas, voltam a ilustrar folhas de papel. Esse diálogo quase lúbrico entre fotografia e cinema é um dos pontos altos de "Terra Estrangeira", filmado todo em preto-e-branco, as cores do desterro, segundo seus diretores. O livro é uma rara oportunidade para se observar com acuidade o trabalho de enquadramento e iluminação do diretor de fotografia Walter Carvalho e de seu assistente Eduardo Miranda. O filme exigiu de Carvalho um verdadeiro trabalho de engenharia fotográfica, já que as tecnologias para filmagem em preto-e-branco estão em extinção. Como o filme era processado na França, a equipe não tinha como ver o copião do que havia sido filmado, um dos rituais mais sagrados dos diretores de cinema. Para aplacar a angústia e a desorientação sobre a produção, Carvalho utilizou uma câmera fotográfica para reproduzir algumas das cenas e ter uma idéia, ainda que distorcida, do que estava fazendo. Mas as imagens que compõem o livro foram extraídas de uma cópia do próprio filme. Para quem assistiu a "Terra Estrangeira", o livro serve para resgatar a memória. Como diz José Avellar no prefácio do livro: "Cinema não se reduz à imagem que passa na tela: é também o que o espectador inventa no imaginário, como resultado da tensão entre o que viu e o que persiste na memória". "O livro, aqui, assim como toda conversa sobre cinema, que se dá após uma projeção, conversa com um amigo ou conversa interior, é uma tentativa de pegar o que resiste na retina e somar à imagem seguinte para seguir o movimento. É o movimento da memória". Editado exatamente como na sequência das cenas do filme, as fotos do livro se transformam num roteiro de imagens. Como numa fotonovela não-linear, as fotos podem ser remontadas e recontadas, gerando outras histórias, num percurso inverso ao dos roteiros escritos, onde as imagens são criadas posteriormente. Num dos melhores diálogos do filme, o personagem Igor, interpretado por Luís Melo, diz para Paco, o protagonista: "Está vendo essa cadeira? Isto não é uma cadeira. Este prato aqui não é um prato. Esta não é uma mesa. São vestígios de uma grande aventura". Nesse universo de espelhamentos, onde as coisas e as pessoas são a resultante das suas imagens com suas trajetórias, as fotos e o projeto gráfico de "Terra Estrangeira", o livro, são sinais, pegadas de uma história, e "Terra Estrangeira", o filme, é o rastro deixado por uma fotografia esmaecida, esquecida na capa de algum livro. Livro: Terra Estrangeira Autores: Walter Carvalho, Daniela Thomas, Walter Salles Lançamento: Relume Dumará Quanto: R$ 42 (112 págs.) Texto Anterior: "Dolores Duran" obscurece relações amorosas no Rio da década de 50 Próximo Texto: Daeniken admite falhas em 'Eram Os Deuses Astronautas' Índice |
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