São Paulo, segunda-feira, 29 de setembro de 1997
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A globalização ainda vai te pegar

THALES DE MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL

1. O que é essa tal globalização?
É a situação atual da economia mundial, ainda em fase de consolidação. Um exemplo: você vê hoje uma indústria de automóveis que fabrica um mesmo modelo de carro em montadoras de três países diferentes e os vende em outros cinco países. As empresas não ficam mais restritas a um país, seja como vendedoras ou produtoras.

2. Qual a origem histórica desse cenário globalizado?
A busca por novos mercados ou matéria-prima barata sempre foi a principal motivação para muitas mudanças históricas, como as grandes navegações de Portugal e Espanha (atrás de matéria-prima) ou a abolição dos escravos (que aumentou o número de consumidores). Nos anos 70, os países viam suas dívidas aumentarem cada vez mais, e isso obrigou a abertura do mercado interno para investidores estrangeiros.
Foi nessa década que entrou na moda o termo multinacional, que caracteriza uma indústria com fábricas fora de seu país de origem.

3. Como e quando nasceu o termo globalização?
No final dos anos 70, os economistas começaram a difundir o conceito de globalização, usado para definir um cenário em que as relações de comércio entre os países fossem mais frequentes e facilitadas. Depois, o termo passou a ser usado fora das discussões econômicas. Nos anos 90, começaram a falar em globalização nos esportes, nas artes...

4. Como é que o mundo foi ficando globalizado?
As barreiras comerciais entre os países começaram a cair, com a diminuição (ou eliminação) de impostos sobre importações, o fortalecimento de grupos internacionais de livre comércio (como a Comunidade Européia e o Mercosul) e o incentivo do governo de cada país à instalação de empresas estrangeiras em seu território.

5. Qual é um exemplo prático da globalização no dia-a-dia?
Na Copa do Mundo de 98, um turista americano poderá comprar em Paris uma bola de futebol de marca alemã fabricada no Paquistão e importada por uma empresa italiana. Há dez anos, os impostos sobre importações tornavam uma compra dessas impossível.

6. Como isso afeta a vida das pessoas? Há dez anos esse turista acabaria comprando uma bola qualquer, fabricada na própria França. Qual a diferença?
Se a empresa alemã montou uma fábrica no Paquistão, é porque encontrou lá condições de baratear o custo das bolas. Essa redução acaba repassada para o consumidor. Ou seja, a bola está mais barata.

7. As pessoas assistem passivamente à globalização?
Não. Se as coisas mudam na hora de comprar, mudam também na produção, e isso afeta o emprego de muita gente. Com a contratação de uma empresa de outro país para fazer algumas peças de seus carros, uma montadora pode demitir empregados e reorganizar funções de outros. O profissional globalizado tem de estar preparado para mudanças em sua carreira.

8. Não vale mais a pena ser um especialista?
A especialização ainda valoriza o profissional, mas ele deve ter uma base de conhecimentos mais amplos para, se necessário, desenvolver outra atividade. É comum, por exemplo, ver médicos que se tornam administradores de hospitais, usando noções de matemática, gerenciamento e marketing.

9. Quais mudanças podem ocorrer na vida de um profissional por causa da globalização?
Podem ser de vários tipos, até mesmo exigir que o profissional mude de país. Na França, por exemplo, o uso de computadores para executar algumas tarefas na linha de montagem das fábricas de automóveis obrigou muitos torneiros mecânicos a procurar empregos em países africanos.
O mesmo acontece na Alemanha, onde trabalhadores braçais vão tentar a sorte em empresas da Turquia, num movimento inverso à imigração turca que existiu durante décadas.

10. Como alguém pode se preparar para mudanças tão radicais?
Procurando ser o chamado profissional globalizado. É importante ter conhecimento de outras línguas, principalmente o inglês, para entender todas as informações que puder conseguir sobre os avanços tecnológicos de sua área.

11. E quem não quer tentar ir trabalhar em outro país?
Às vezes isso nem é necessário, porque a oportunidade de trabalho globalizado chega até você. Quer um exemplo? Está aumentando o número de filmes ou co-produções estrangeiras rodadas no Brasil, porque aqui o aluguel das locações e a mão-de-obra são mais baratos. Atores e técnicos brasileiros dessa área podem conseguir empregos se tiverem bom conhecimento de inglês. No caso dos técnicos, é bom estar familiarizado com os equipamentos mais modernos que são usados nessas produções.

12. Qual o papel da Internet nessa história toda?
A Internet serve de alavanca para a globalização. Substitui com vantagens o telefone, o fax, o correio convencional e as enciclopédias. Está a caminho de substituir também jornais, revistas e TV. Permite rapidez na captação das informações. Todos os especialistas em comunicação afirmam que um terminal de acesso à Internet será um item obrigatório para qualquer escritório num prazo de cinco anos e para todas as residências em até, no máximo, 20 anos.

13. O acesso mais fácil à informação não pode levar à massificação, à falta de criatividade?
Globalização não pode ser confundida com massificação. Na nova situação do mercado, não há interesse na informação massificada. Para o empregador, saber o que todos sabem é só uma obrigação do funcionário. Ele quer um profissional que saiba raciocinar a partir das informações que tem.

14. O talento continua valendo para quem quer se dar bem numa profissão?
Mais do que nunca. A globalização só aumenta a competição por um bom lugar no mercado. Um exemplo bom é o futebol. Esse esporte foi pioneiro no processo de globalização, com os grandes clubes europeus e japoneses indo buscar os melhores jogadores na América Latina e na África. Por causa disso, hoje qualquer juvenil de destaque no Brasil já sonha com os milionários salários da Europa.
O jogador Leonardo, da seleção brasileira, atualmente está no Milan e começa a falar italiano. Antes, jogou em times da Espanha, do Japão e da França. Além de dominar o inglês, Leonardo consegue dar entrevistas nos idiomas de todos os países em que jogou. É o perfeito atleta globalizado.

Consultoria: Rafael Tortelli Neto e Diógenes Alencar Moura, coordenadores do Instituto de Estudos Mercadológicos da Universidade de São Paulo; Jacob Perkler, economista e consultor de comércio exterior do Banco Central e da Fiesp LEIA
MAIS sobre a globalização na página 6-6

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