São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998
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Ensino privado tem gestão empresarial

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Poucos setores da economia estão passando por transformações tão expressivas quanto o formado pelas faculdades e universidades privadas.
Seu faturamento cresceu como poucos segmentos econômicos; muitas escolas estão deixando de ser administradas por famílias e se profissionalizando; aumentou muito o investimento das universidades em marketing; a criação de novos cursos ou definição do número de vagas passou a ser determinada por pesquisas de mercado.
É que está ocorrendo nas universidades particulares um processo semelhante de reestruturação ao que ocorreu com empresas de outras áreas econômicas.
"Muitas universidades ou faculdades continuam sendo controladas pelos mesmos grupos familiares, mas é evidente o processo de profissionalização", afirma o ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso, ele mesmo ligado a esse processo ao dirigir o Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), que há quatro anos mantém uma faculdade do Rio e está se expandindo para São Paulo.
Essa tendência de mudança no perfil das universidades particulares enquanto empresas deve continuar, viabilizada pelas transformações nas regras do ensino superior adotadas pelo Ministério da Educação e do Desporto.
Fim do vestibular
Entre as mudanças mais importantes dos últimos anos estão a virtual extinção do vestibular tradicional e a permissão para que sejam criados cursos superiores de curta duração -os chamados cursos sequenciais.
"Faz parte da estratégia do governo aumentar o número de pessoas cursando faculdades no país, onde só 10% dos jovens entre 18 e 25 anos estão matriculados em cursos universitários.
Como o governo não tem recursos para aumentar as vagas nas universidades públicas, há campo para o setor privado", afirma Gabriel Rodrigues, presidente do Semesp (reúne as instituições de ensino superior de São Paulo).
Faturando alto
Neste ano, as universidades e faculdades privadas movimentaram mais de R$ 4 bilhões (computando-se apenas o valor das mensalidades dos alunos de graduação, sem contar os pagamentos dos cursos de pós-graduação e de extensão), segundo o Semesp.
É quase o mesmo volume que a indústria de cigarros fatura no mercado brasileiro, segundo o Instituto Nielsen.
Hoje, existem cerca de 1,2 milhão de alunos matriculados em faculdades particulares -cerca de 61% do total de universitários do país.
No Estado de São Paulo, os matriculados em faculdades privadas são 85% do total e pagam em média de R$ 350,00 a R$ 400,00 por mês, de acordo com Gabriel Mário Rodrigues, presidente do Semesp.
No Brasil, o valor médio das mensalidades é um pouco menor, ficando em torno de R$ 340,00. Mesmo assim, é um valor expressivo, já que as universidades contam com uma vantagem ambicionada por qualquer empresa fornecedora de produtos ou serviços: a "fidelidade" dos alunos por quatro ou cinco anos.
Tanto a evasão de alunos quanto a inadimplência cresceram bastante nos últimos anos, mas os custos com essas perdas de receitas já estariam incorporados às mensalidades em muitas escolas. A desistência nas faculdades particulares é de cerca de 15%, diz Rodrigues.
"Muitas escolas estão investindo para tentar manter o aluno até o final do curso, melhorando a qualidade e oferecendo mais serviços, com programas culturais", diz ele.
Novo perfil
A constatação de que ser dono de uma faculdade ou universidade pode ser um bom negócio, apesar do aumento da inadimplência, atraiu novos investidores no setor, empresários de outras áreas da economia que estão apostando no negócio da educação.
Na maioria dos casos, o retorno financeiro não é o único atrativo, mas um fator importante na tomada de decisão.
O caso mais ilustrativo é o de Eduardo da Rocha Azevedo, ex-presidente da Bolsa de Valores de São Paulo, que deixou o mercado financeiro e se tornou sócio de uma faculdade de economia e administração em Campinas (SP).
Cláudio Haddad, ex-sócio do Banco Garantia, que foi vendido para uma instituição estrangeira neste ano, também estuda a possibilidade de investir em educação.
Levantamento informal feito por um consultor da área mostra que nas duas últimas décadas teriam sido fechadas em São Paulo apenas duas instituições de ensino superior privadas.
Outro candidato a dono de faculdade constatou que os lucros do setor já foram melhores antes que o governo começasse a mudar as regras sobre o pagamento de impostos e contribuições.
Novas mudanças na legislação poderão ser anunciadas.
"O negócio da educação é bom para quem for profissional e souber investir em qualidade", afirma Rodrigues. Segundo o Semesp, entre 10% e 15% das instituições de ensino superior de São Paulo já optaram por ter um regime jurídico de empresa que quer ter lucro.

LEIA MAIS sobre o mercado da educação na pág. 3-3

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