São Paulo, sábado, 4 de abril de 1998
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Buenos Aires terá maior mesquita da AL

LÉO GERCHMANN
DE BUENOS AIRES

O governo argentino doou para a Arábia Saudita uma área de 33 mil metros quadrados, avaliada em US$ 20 milhões, na qual será construída a maior mesquita da América Latina.
O terreno se localiza no bairro Palermo, um dos pontos mais valorizados de Buenos Aires, habitado por moradores de classe média alta.
O presidente argentino, Carlos Menem, arranjou, assim, uma maneira bastante original de mostrar que estabelece com nitidez as diferenças entre religiosidade e fanatismo e entre uma comunidade pacífica e grupos fundamentalistas afeitos ao terror. Foi claro o recado de apoio enviado à comunidade muçulmana argentina.
A doação de Menem foi prontamente aceita pelos sauditas. O curioso nessa doação é que a imigração islâmica partindo da Arábia Saudita é irrisória. Há, segundo o censo do Centro Islâmico, 1 milhão de muçulmanos na Argentina, mas oriundos de outros países árabes. Isso sem levar em consideração os árabes cristãos.
Na Embaixada da Arábia Saudita e no Centro Islâmico, fontes consultadas pela Folha não souberam dizer os motivos pelos quais a mesquita será construída na Argentina e não no Brasil, onde há forte presença muçulmana.
O que pesou mesmo, segundo a Folha apurou, foi a doação feita pelo governo. Por meio dessa doação, que ocorre quando se consolida um inevitável conflito diplomático com o Irã, Menem, que é de origem árabe, trata de deixar clara a sua visão sobre a importância muçulmana na formação étnica do país.
Iraniano proibido
O desgaste com o Irã se deve ao fato de investigações já terem concluído que o país participou dos atentados à Embaixada de Israel (em 1992, com 29 mortos) e à Associação Mutual Israelita Argentina (em 1994, com 86 mortos).
Poucos dias atrás, a Argentina tomou sua primeira medida de retaliação ao Irã depois de a Corte Suprema concluir pela participação da Jihad (Guerra Santa) Islâmica nos dois atentados: proibiu a entrada do diplomata Moshen Rabbani, ex-adido cultural iraniano, no país.
Rabbani, que está em Teerã, viveu 14 anos em Buenos Aires. Além de trabalhar na embaixada iraniana, dirigia uma mesquita fundamentalista.
O ministro da Justiça, Raúl Granillo Ocampo, disse à Folha que uma medida mais drástica em relação ao Irã, como o rompimento oficial, seria inútil. "E se nós rompemos e depois ocorre um terceiro atentado, o que as pessoas vão dizer?", perguntou Ocampo, demonstrando a preocupação do governo Menem.
Zulema Yoma, ex-mulher de Menem, diz que os atentados são consequência do alinhamento existente entre o governo argentino e os Estados Unidos no conflito contra o Iraque.
Contraste
A mistura de ensino e cultura com religiosidade é o contraste perfeito que o governo argentino procura mostrar em relação aos atos que vinculam fé e terrorismo.
Além da mesquita propriamente dita, haverá no local um centro de esportes, uma área cultural com anfiteatro, estacionamento subterrâneo e dormitórios para estudantes vindos do interior.
O investimento a ser feito pela Arábia Saudita para a construção do complexo chega aos US$ 25 milhões. Os prédios serão construídos pelo arquiteto argentino Mario Roberto Alvarez, na esquina entre as avenidas Bullrich e Libertador.
O nome do complexo será Fundação Centro Cultural Islâmico Rei Fahd, mas a intenção não foi doar o terreno, avaliado em US$ 20 milhões, para utilização apenas da Arábia Saudita. A doação tem como objetivo os argentinos muçulmanos.
A escola, com capacidade para 360 alunos, terá um currículo argentino com aprendizagem do idioma árabe do jardim de infância até o encerramento do colegial. As áreas de cultura e esportes serão abertas ao público.

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