São Paulo, domingo, 14 de junho de 1998
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Até nunca mais

LUIZ CAVERSAN

Rio de Janeiro - Como vivi na pele boa parte dos efeitos nefandos de um regime de força, que condenou mais de uma geração -mas principalmente a chamada geração 70- a ser menos culta, menos informada e menos instruída do que gostaria, poderia e deveria, registro aqui minha modesta opinião quanto à extinção do cargo de censor federal: já vai tarde e que não volte!
Aliás, já vai tarde demais, porque a função de censor deveria ter sido extinta há dez anos, ou seja, exatamente quando a censura foi abolida do país.
Mas, como sempre é tempo de se exterminarem tais tipos de excrescências, só nos resta aplaudir a iniciativa.
Levando em conta apenas a censura mais recente, que foi imposta ao país a partir de 1970, quantos livros, filmes, peças de teatro, programas de TV e outros tipos de manifestação da inteligência humana foram mutilados, escondidos, achincalhados ou simplesmente impedidos de circular em nome da moral e dos bons costumes? Incontáveis.
Quanto medo, quanta dissimulação durante anos a fio para conseguir ler um livro, montar uma peça, liberar uma música, exibir um mísero curta-metragem?
Nos tempos mais duros e arrogantes da repressão, um único censor valia mais do que Shakespeare, Gorki, Eisenstein, Chico Buarque, Antonio Callado e Glauber Rocha juntos. Tudo podia, não havia direitos que impedissem sua ação castradora.
Bastava que o censor não entendesse direito o que queria dizer este ou aquele trecho de uma peça clássica do teatro universal para que tal trecho ou a peça inteira fossem proibidos. Em alguns casos, os artistas eram ameaçados, quando não humilhados ou detidos. Isso ocorreu muitas vezes.
O ser humano é pródigo em esquecer logo esse tipo de coisa. Por isso, não pude deixar passar em branco essa oportunidade de, digamos, refrescar a memória. Afinal, como se dizia antigamente, o preço da liberdade é a eterna vigilância.
Então, adeus, censores. Até nunca mais.

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