São Paulo, domingo, 28 de junho de 1998 |
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'Quali' surgiu como arma da propaganda
VERA MAGALHÃES
A frase, dita pelo presidente norte-americano Bill Clinton durante a campanha à reeleição, em 1996, dá uma pista da importância que esse tipo de análise ganhou entre os políticos na última década. A pesquisa qualitativa foi introduzida no Brasil na década de 50. A princípio, foi utilizada pela publicidade -para procurar entender as motivações e necessidades do consumidor- e pela sociologia e a antropologia, que utilizavam seus métodos nos chamados "estudos de comunidades". A pesquisa motivacional, como era chamada, teve seus fundamentos baseados na psicologia e passou a buscar o "entendimento profundo dos problemas". Esse tipo de análise passou a ser usada pela área de marketing de grandes empresas. Já na década de 70, as "qualis" já eram reconhecidas como confiáveis, o que ampliou sua utilização. Arma política A pesquisa qualitativa deve ser uma das principais armas de partidos políticos para traçar estratégias de campanha e moldar a imagem dos candidatos para as eleições deste ano. Nas eleições de 1996, ela foi decisiva na campanha do candidato vitorioso à Prefeitura de São Paulo, Celso Pitta (PPB). O prefeito deve sua candidatura em grande parte a vários levantamentos qualitativos realizados a pedido do ex-prefeito Paulo Maluf. A equipe de marketing da campanha do PPB reuniu vários grupos de pesquisa e apresentou quatro virtuais candidatos -além de Pitta, Reinaldo de Barros, Lair Krahenbuhl e Roberto Paulo Richter. Pitta foi escolhido em todas as classes sociais. Os principais fatores que ditaram a escolha foram a cor de sua pele e uma suposta timidez diante do vídeo. Especialistas nas áreas de pesquisa e marketing ouvidos pela Folha apontam o crescimento do uso de pesquisas qualitativas nas campanhas. Para Nélson Marangoni, presidente da Anep (Associação Nacional de Empresas de Pesquisa), a qualitativa é "uma modalidade de pesquisa em crescimento no Brasil, cada vez mais usada pelas áreas de marketing e propaganda". Segundo ele, antes desse tipo de análise, "era mais difícil interpretar os resultados das pesquisas estatísticas e suas implicações". Marangoni detecta o crescimento da demanda por análises qualitativas há cerca de sete anos. Segundo ele, 30% do volume de pesquisas realizadas por sua empresa, a Research International Brasil, é de levantamentos qualitativos. Esdras Borges Costa, professor de metodologia da pesquisa da FGV (Fundação Getúlio Vargas), diz que a pesquisa qualitativa é "uma espécie de complementação ao levantamento estatístico". "Com ela, aprende-se muito profundamente sobre o objeto em estudo", diz Costa. Segundo o professor, embora seja subjetiva, "a pesquisa qualitativa é cientificamente eficaz para verificar certos aspectos da realidade". Modalidades Há duas modalidades principais de pesquisas qualitativas: a realizada por meio de grupos de discussões e a que adota entrevistas individuais em profundidade. Nas campanhas políticas, a mais utilizada é a discussão em grupos, em que pessoas que nunca tenham se visto antes, selecionadas aleatoriamente a partir de uma divisão de classes sociais, distribuição geográfica, faixa etária e sexo, reúnem-se em uma sala para debater um tema que lhes é proposto. As reuniões geralmente são gravadas em áudio e vídeo. As discussões são comandadas por um moderador e acompanhadas à distância por analistas que não são vistos pelos entrevistados (assistem às reuniões atrás de um espelho). As opiniões emitidas pelos entrevistados são anotadas e, depois, analisadas e compiladas em uma conclusão -que em nada se assemelha com a tabulação de pesquisas estatísticas, pois tem um grau de subjetividade maior. O método que se usa no Brasil de pesquisa qualitativa se assemelha ao francês: utiliza roteiros de perguntas relativamente curtos, agrupando em média oito participantes, por um período aproximado de duas horas e meia. Nos Estados Unidos, os roteiros são longos, os grupos têm em média 12 participantes e as reuniões não duram mais de uma hora e meia. O estilo inglês trabalha com um tempo de duração semelhante ao norte-americano, mas com menos perguntas e uma abordagem mais detalhada. O ideal é que as mesmas pessoas não voltem a participar de grupos de "qualis" -como são chamadas essas pesquisas entre os especialistas- num prazo de dois anos. "Com o aumento do volume de qualis, muita gente está se profissionalizando, o que vicia as respostas", diz Marangoni. Para evitar esse problema, a Anep criou uma espécie de banco de dados de participantes de grupos de pesquisa. As empresas associadas consultam essa lista e evitam repetir os entrevistados. A entrevista individual é feita a partir de um roteiro prévio, mas sem perguntas fixas. A sequência das questões vai sendo determinadas a partir das respostas. Inconsciente Na psicologia, começa a ser usada a pesquisa qualitativa em nível aprofundado de consciência, ou seja, com o objetivo de explorar o inconsciente dos entrevistados. Segundo a psicanalista Marina Tschiptschin, que trabalha com pesquisas qualitativas há 30 anos e uma das especialistas na pesquisa em nível profundo, "quando se trabalha no nível normal de consciência, o resultado é muito influenciado por racionalizações". Ela aplica o método em pesquisas de mercado e comportamentais, mas nunca utilizou o nível profundo em pesquisas ligadas à política. "Mas seria muito interessante ver como aparecem Lula e Fernando Henrique no inconsciente das pessoas", afirma. Texto Anterior: Veja quem são os grupos Próximo Texto: A Schering pode virar farinha; Agora, o Pronave; Cabeça a prêmio; Manual de tecnomistificação; Doutor Vasco sorri; Antonio Carlos Campos de Carvalho Índice |
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