São Paulo, quarta-feira, 01 de abril de 2009

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Crítica/cinema/"Cildo"

Narração é trunfo de documentário

Atração do É Tudo Verdade, "Cildo", de Gustavo Moura, apresenta trajetória de artista por meio de suas destacadas obras

Divulgação
"Desvio para o Vermelho", instalação de Cildo Meireles que pertence ao acervo do Instituto Inhotim, em Brumadinho (MG)

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Existe uma tendência na produção de documentários sobre arte e artistas contemporâneos que muitas vezes usa as obras desses artistas como mera escada para ressaltar a visão ou mesmo a opinião de seu diretor, uma espécie de sequestro "bem-intencionado".
Felizmente, esse não é o caso de "Cildo", de Gustavo Moura, que hoje é exibido pela primeira vez em São Paulo. No documentário, existe um imenso respeito e admiração por Cildo Meireles, o artista-tema do filme, que se revela por meio de suas longas falas, muito mais significativas que as demais participações.
Quem já conviveu um pouco com Cildo sabe que o artista é um grande contador de histórias, um narrador nos moldes a que Walter Benjamin se referiu em seu antológico texto que aborda esse assunto.
"A experiência que passa de pessoa a pessoa é a fonte a que recorreram todos os narradores", escreveu Benjamin, em 1936. Por isso, não deixa de ser reveladora a maneira como Cildo sempre conta uma história, ao longo do filme, para explicar sua forma de criação.
A memória de ter visto de sua janela, quando criança, um andarilho que durante a noite montou uma casa perfeita em miniatura e que pela manhã abandonou tudo, por exemplo, é apresentada pelo artista como um fato emocionante e que o teria motivado a escolher a formação em artes plásticas.
Em alguns casos, vê-se até o artista recontando algumas de suas histórias, uma forma de reforçar essa vertente narrativa. É por meio dela, afinal, que se compreende melhor a experiência que Cildo propõe em cada uma de suas obras -várias delas, ao menos dez- muito bem apresentadas ao longo do documentário.
Entre elas, estão desde aquelas vistas em 2006 na Estação Pinacoteca, em São Paulo -como "Babel", "Marulho" e "Cruzeiro do Sul"-, até "Desvio para o Vermelho" -uma de suas obras mais conhecidas, do acervo do Instituto Inhotim, em Brumadinho (MG). Outras não são tão famosas, como "Liverbeatlespool", uma instalação sonora com música dos Beatles.
Também é significativo o trecho utilizado de um outro filme sobre Cildo, dirigido por Wilson Coutinho (1947-2003), em 1979, no qual é explicada, de forma hilária, a obra "Inserções em Circuitos Ideológicos". Cildo é sem dúvida um dos protagonistas da cena contemporânea nacional, como atesta a grande repercussão que obteve sua individual na Tate Modern, em Londres -encerrada em janeiro passado-, onde, aliás, estreou "Cildo". Com o documentário, sua obra, tão pouco vista frente à precariedade dos museus brasileiros, ganha nova visibilidade.


CILDO

Direção: Gustavo Moura
Quando: hoje, às 21h, e amanhã, às 15h, no Cinesesc; sex., às 13h, no CCBB
Classificação: não indicado a menores de 14 anos
Avaliação: ótimo



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