São Paulo, quarta-feira, 02 de maio de 2001

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FOTOGRAFIA

"Quando Vejo, Sou Vista", de Evelyn Ruman, começa hoje no MIS dentro do projeto "A Mulher Não Existe, Existe?"

Imagens se tornam espelho para internas

Divulgação
Foto da exposição "Quando Vejo, Sou Vista", que hoje abre no MIS e faz parte de "A Mulher Não Existe, Existe?"


EDER CHIODETTO
EDITOR-ADJUNTO DE FOTOGRAFIA

Mulheres que perderam a sensação de seus corpos e não se reconhecem nem sequer diante do espelho. Marginalizadas por serem mulheres. Loucas. Criminosas. Foi mergulhando nesse universo entre as internas do Manicômio Judiciário de Franco da Rocha (SP) que a fotógrafa paulistana Evelyn Ruman extraiu imagens para a exposição "Quando Vejo, Sou Vista", que abre hoje no MIS (Museu da Imagem e do Som), dentro do evento "A Mulher Não Existe, Existe?".
"Quando Vejo, Sou Vista" é mais uma das exposições que integram o 5º Mês Internacional da Fotografia, organizado pelo Nafoto (Núcleo dos Amigos da Fotografia). Como em outras mostras do mês em cartaz, as fotografias de Ruman também sofrem intervenções após o ato fotográfico.
Mas neste caso não é a própria fotógrafa que pinta sobre as imagens, mas sim as pessoas fotografadas.
Após realizar um extenso trabalho que visava resgatar a auto-estima de mulheres de um instituto psiquátrico em Santiago, no Chile, onde morou, Ruman foi convidada por uma psicóloga para realizar obra semelhante com as internas de Franco da Rocha.
Durante dois anos de convivência com essas mulheres, Ruman fotografou-as com o intuito de discutir com cada uma delas questões ligadas à identidade e ao amor próprio. Com as fotografias ampliadas, Ruman voltou ao manicômio munida de canetas hidrocor, pincéis e tintas.
O passo seguinte foi a descrição, por parte das internas, da sensação que tinham diante de cada cor. "Muitas associavam o vermelho e o preto à dor e à angústia", diz Ruman.
Quando elas conseguiam ligar uma sensação a uma cor, Ruman perguntava qual era a cor contrária, que deveria representar a sensação oposta. Dessa forma cada interna integrada ao projeto foi estabelecendo uma cartela de cores personalizada, decodificando, assim, muito do seu inconsciente.
Proibidas de portarem espelhos, muitas dessas mulheres haviam perdido totalmente a noção de como eram seus rostos, seus corpos. Ao se verem nas fotografias de Ruman, se deparavam, muitas vezes, com pessoas absolutamente estranhas a elas.
Resgatar o elo perdido entre o ser e sua imagem é um trajeto complexo que passa pela revalorização da auto-estima.
Ao pintarem seus retratos, com cores que simbolizavam seus sentimentos mais recônditos, as internas do manicômio judiciário acabaram por gerar momentos e imagens de grande emoção.
"Quando elas se deram conta de que podiam modificar alguma coisa na vida delas, começando pelo reconhecimento do corpo e das feições, começou a haver uma recuperação da vaidade e da feminilidade. Muitas começaram a pedir batom, cortar melhor o cabelo e tomar mais banho", conta.
Ampliadas em grande formato, essas imagens estão entre as mais originais e corajosas de toda a programação do mês. Imperdível.
Além da exposição de Ruman, "A Mulher Não Existe, Existe?" também inclui as mostras de fotografia "Maldita Sois Vós entre as Mulheres", de Marlene Bergamo, repórter-fotográfica da Folha, "Anjos Proibidos", de Fábio Cabral, "O Filho Predileto de Rajneesh", de Fabiana Figueiredo, e "Vidas Invisíveis", de Letícia Valverdes. Todas sendo inauguradas hoje.
Uma extensa programação de cinema, vídeo e palestras que discutem o feminino completam a programação do evento no Museu da Imagem e do Som.


A MULHER NÃO EXISTE, EXISTE?
0 evento que inclui mostras de fotografia, cinema, vídeo e palestras. Abertura: hoje, às 20h. Quando: ter. a dom., das 14h às 22h; até 1º/7. Onde: Museu da Imagem e do Som (av. Europa, 158, tel. 3085-1498). Quanto: Entrada franca.




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