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São Paulo, sábado, 03 de maio de 2003

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"VESTIR O PAI"

Direção de Paulo Autran e texto de Mário Viana valorizam trabalho do elenco em comédia sobre família

Peça consagra a atriz Karin Rodrigues

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Karin Rodrigues, Leona Cavalli e Otávio Martins em cena da comédia "Vestir o Pai", peça com direção de Paulo Autran e texto de Mário Viana


CRÍTICO DA FOLHA

Não é difícil deduzir o que foi que levou Paulo Autran a dirigir "Vestir o Pai". Aparadas as insolências mais escabrosas do sempre provocador Mário Viana, o seu texto, respeitando rigorosamente as unidades de tempo, lugar e tema, se presta a um bom exercício de atores, principal foco de interesse do ator/diretor.
Para contar a tomada de consciência de Alzira, sessentona de classe média que vê sua vida tomar outro sentido diante da morte iminente de seu marido, desmistificando assim não só a imagem do "chefe de família trabalhador" como também a pretensa modernidade do filho e filha, no fundo presos também às armadilhas das convenções, Autran exigiu pouco do cenário de George Freire -que chega a utilizar um antiquado telão pintado simulando a paisagem da janela- e a iluminação de Elias Andreato, quase que apenas uma luz geral.

Atrizes
Autran dirige o espetáculo em função dos atores -e sobretudo de uma atriz, sua companheira de sempre, Karin Rodrigues.
É como se Alzira, que sempre viveu generosamente em segundo plano, bastando-se em ser aquela que "segurava as pontas" da família, fosse o alter ego de uma atriz que se destacou antes de tudo como coadjuvante, na função injustamente menosprezada de "escada" para os protagonistas.
É a vez então de Karin Rodrigues ser protagonista, e ela não desperdiça um só momento.
Ganha imediatamente a empatia da platéia justamente ao se despojar de qualquer glamour, alternando rapidamente uma ameaça de tom melodramático com o pragmatismo das decisões a serem tomadas.
Emblematicamente, trata-se antes de tudo de escolher, com o marido ainda vivo, a roupa que ele irá usar no caixão, o que dá margem a um humor ao mesmo tempo transgressor e terno.

Metáfora
A situação tragicômica rapidamente se desdobra em metáfora: vestir o pai é tentar manter sua dignidade mesmo revelando-se progressivamente o canalha que ele foi.
Mas isso não resulta em conformismo, em um reacionarismo comum em comédias populares. Como a Nora de "Casa de Bonecas" de Ibsen, mas uma Nora de periferia e de terceira idade, Alzira redescobre sua função de dona-de-casa, reafirmando exemplarmente sua dignidade.
Colaborada pela discreta simpatia de Otávio Martins, e pela contenção generosa de Leona Cavali que, acostumada a fortes protagonistas, mantém uma discrição que quase chega no formalismo, Karin Rodrigues faz assim de Alzira uma personagem tão forte quanto a Romana do "Eles Não Usam Black-Tie", de Guarnieri, ou a Joana de "Gota d'Água" de Chico Buarque e Paulo Pontes. Por sua atuação, a ida ao teatro se faz indispensável.
(SERGIO SALVIA COELHO)


Vestir o Pai
   
Texto: Mário Viana
Direção: Paulo Autran
Com: Karin Rodrigues, Leona Cavalli e Otávio Martins
Quando: de qui. a dom., às 19h30; até 1º/6
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, região central, tel. 3113-3651)
Quanto: R$ 15
Patrocinador: Banco do Brasil



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