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"LÍVIO ABRAMO: CEM ANOS"
Mostra supera caráter de ilustração
TIAGO MESQUITA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Hoje em São Paulo podemos
entrar em contato com boa
parte da arte moderna impressa
do Brasil. Ao menos duas exposições recentes nos dão a medida da
contribuição da gravura à arte
mais recente do país: "A Gravura
Vai Bem, Obrigado", panorâmica
coletiva da Galeria Virgílio, e o interessante retrospecto do trabalho de Lívio Abramo (1903-1992)
no MAM -"Lívio Abramo: Cem
Anos".
Acompanhando o percurso de
Abramo conseguimos entender
especificidades da gravura entre
nós. Embora a mostra tenha desenhos, vemos uma dedicação ao
meio rara em artistas modernos.
Tal esforço incorporava a discussão específica à gráfica, mas buscava fugir das armadilhas das discussões meramente técnicas e
transcender o caráter acessório de
ilustração.
Pois esta criação mais arejada e
autônoma passava pelo interesse
de Abramo no expressionismo.
Curiosamente, este interesse toma formas diferentes no decorrer
de sua trajetória.
Num primeiro momento Abramo volta seus olhos para temas
primitivistas, caros a Gauguin e
aos primeiros expressionistas.
Só que, aqui, uma certa tropicalização dos ritmos e dos motivos
do trabalho não aparece como
um contraponto distante à vida
fria da modernidade européia.
Pelo contrário, aparece, muitas
vezes, lado a lado com a modernização, como um jeito matreiro de
lidar com suas mazelas, ou se refugiar de suas obrigações.
Este anticapitalismo se expressa
no elogio da vida em meio a vegetais agigantados, próxima à natureza e na organização comunitária da vida.
Já na segunda metade dos anos
30 este caráter resistente aparece
de modo mais pronunciado.
Lívio Abramo torna-se mais
próximo do segundo expressionismo. Os traços marcados e as
manchas na superfície, que denunciavam sensualidade em trabalhos anteriores, aqui parecem
distinguir as figuras do meio que
as circunda. Fazendo-as ou personagens solitários ou em atos de
destaque.
Nas decisivas ilustrações para
"Pelo Sertão" (1947), livro de
Afonso Arinos, a gravura de Lívio
Abramo aparece em trânsito: ao
mesmo tempo em que suas marcas dão maior dramaticidade às
cenas, elas também parecem caminhar para a padronização mais
abstrata das paisagens do artista.
Marcando o caráter figurativo das
cenas, mas também marcando
uma rítmica mais formal.
Aliás, nestes conhecidos trabalhos, o artista parece reatar com
seus inícios mais tropicais. Na
malha caótica do tecido urbano,
descrita de cima, ele parece procurar mais uma harmonia açucarada dos diferentes meios (e a
criatividade popular construindo
beleza), do que um maravilhamento monumental diante de
tanta desigualdade.
Nem sempre dá em boa arte,
mas certamente elas são infalivelmente reveladoras deste jeito macio de lidar com a beleza no país.
Tiago Mesquita é crítico de arte
Lívio Abramo: Cem Anos
Quando: ter., qua. e sex., das 12h às 18h;
qui., das 12h às 22h; sáb. e dom., das 10h
às 18h. Até 29/6
Onde: MAM-SP (pq. Ibirapuera, portão 2,
tel. 5549-9688)
Quanto: R$ 5
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