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Centro esquece murais de Di
Feitos nos anos 50, painéis de Portinari e Di Cavalcanti são ameaçados pela falta de conservação
Prédios da região central de São Paulo reúnem bom acervo que casa as artes plásticas e a arquitetura da fase modernista
Tuca Vieira/Folha Imagem
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Fachada do hotel Jaraguá, na rua Martins Fontes, com mural feito por Di Cavalcanti, que presta homenagem à imprensa; painel é dos mais bem conservados entre os realizados pelo artista
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
Nos anos 50, um grupo de
prédios erguidos no centro de
São Paulo formou uma pequena pinacoteca pública, praticamente a céu aberto. Arquitetos
modernistas convocaram artistas plásticos, como Portinari e
Di Cavalcanti, para desenvolver murais que dialogavam
com as formas ousadas de suas
construções.
Como boa parte do centro da
cidade, esses murais estão esquecidos. Em muitos casos, estão a um passo de se perder como patrimônio. "Já encontrei
murais que foram demolidos,
pintados por cima, emparedados ou cobertos, como se fossem uma peça de decoração
que ninguém mais quer", diz a
arquiteta Isabel Ruas, que fez
sua dissertação de mestrado na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP sobre os murais dos anos 50.
Um dos melhores exemplos
está a dois quarteirões da prefeitura, no calçadão da rua José
Bonifácio: uma obra em "vidrotil" (mosaico de vidro) de Di
Cavalcanti que retrata os trabalhadores do café. Criado especialmente para a entrada do
edifício Triângulo, projetado
por Oscar Niemeyer em 1951,
ele se encontra remendado.
Algumas das pastilhas brancas, roxas e azuis caíram e foram substituídas por várias cor
de gelo. "Infelizmente, muitos
condôminos e visitantes do
prédio nem sabem desse mural", diz Everaldo dos Santos,
zelador há dez anos. Segundo
ele, a obra foi adulterada há cerca de 11 anos.
A alguns quarteirões dali, está o segundo maior mural -e
um dos raros abstratos- da
carreira de Cândido Portinari.
Com 20 m de largura e 6 m de
altura, ocupa boa parte da galeria Califórnia, projetada por
Niemeyer.
"O tombamento de alguns
desses prédios protege apenas
a fachada e alguns elementos
internos, mas sem fazer menção aos murais", diz a arquiteta
Mirthes Baffi, do Departamento de Patrimônio Histórico da
Secretaria Municipal de Cultura. "É uma pena porque eles
eram elementos importantes
na concepção desses prédios. O
modernismo queria casar várias artes."
Baffi se lembra de vários casos dessa integração. "O paisagismo de Burle Marx e os painéis de Portinari, Di Cavalcanti
e de Athos Bulcão nos prédios
do Niemeyer eram perfeitamente integrados com a criação arquitetônica." Duas das
construções mais emblemáticas do século 20 no Brasil, o antigo Ministério da Educação,
no Rio de Janeiro, e a igreja da
Pampulha, em Belo Horizonte,
contam com grandes painéis
em azulejo de Portinari.
"Os murais não estavam ali
para ocupar um pedaço da parede. Eles definiam uma superfície inteira, criavam novos espaços com destaque", diz Ruas.
Reforma
Mas ela acha que o pior já
passou e dá vários exemplos de
murais em bom estado ou restaurados nos últimos anos, como os de Di Cavalcanti nas fachadas do hotel Jaraguá e do
teatro Cultura Artística.
Um passeio pela avenida Higienópolis, entre a rua Itambé e
a avenida Angélica, revela vários prédios residenciais modernistas que possuem murais
bem conservados nas fachadas.
O avanço da tecnologia permitiu que um painel de Portinari fosse retirado e restaurado
em 2004. "Bandeirantes", de
quase 8 m de largura, ficou durante cinco décadas decorando
o bar do hotel Comodoro.
Renovado, foi colocado à
venda e esteve em exposição na
Bolsa de Mercadorias e Futuros no mesmo ano. Mas, em
tempos nos quais os adornos
favoritos de prédios da elite são
pirateados de palacetes franceses, o mural modernista ainda
não achou comprador.
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