São Paulo, Sábado, 04 de Setembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA - "A ARTE DA COMÉDIA"
Espetáculo encara a crise do teatro

NELSON DE SÁ
da Reportagem Local

Com "A Arte da Comédia", de Eduardo de Filippo, escrita num instante de "terra arrasada" do teatro italiano, o diretor Márcio Aurélio e sua cia. Razões Inversas dialogam com a "terra arrasada" do teatro brasileiro.
Os ingredientes estão lá: falta de público, descaso do Estado com a arte, resistência quixotesca do teatro. Não falta referência à corrupção no apoio estatal.
Como em quase toda montagem da cia. Razões Inversas, essa pode não ser brilhante, mas é exata, construída ao detalhe. As cenas têm o impacto adequado e se alinham ao tema central -até na manutenção do intervalo, praticamente banido dos temerosos espetáculos brasileiros.
Há interpretações excessivas e outras mais realistas, mas de todas exala a referência ao palco, a metalinguagem. De outro lado, o humor é uma aula: surge do medo, da surpresa, da histeria, em notas diversas de emoção.
Mas algo não decola. Talvez seja o público tão pequeno, uma dezena na apresentação vista -embora a peça pareça, estranhamente, pedir pouco público.
Talvez seja a uniformidade das atuações, de medianas para boas. Ou talvez seja a quase resignação do protagonista, um saudosista, carregado de melancolia, Walter Breda -o líder da companhia dentro da companhia, na aparente peça-dentro-da-peça.
Ou talvez o problema seja exatamente defender o teatro, o que é desnecessário: ele está aí como estava antes, não vai morrer por mais que se repisem as previsões, década sobre década.
É certo que o atual modelo brasileiro, do apoio privado estimulado pelo Estado, fracassou. Mas essa discussão, como proposta no texto, é esquisita, por retratar as velhas companhias comerciais da metade do século.
De Filippo foi na Itália mais ou menos o que foram Os Comediantes e o TBC no Brasil: a rejeição do teatro comercial, retratado na peça, em favor da "arte" -como se o anterior não o fosse. O teatro em crise, hoje, é sobretudo o da "arte". É o de Márcio Aurélio e cia. Razões Inversas. Aliás, está aí um ponto pouco sublinhado pelo espetáculo. Campese não quer o dinheiro do prefeito, do Estado -quer a sua presença, quer o prefeito na platéia. O dinheiro, que venha da bilheteria.
É tocante o esforço de artistas que buscam esclarecimento em sua própria arte em crise: a busca se dá em cena, dentro e fora da ficção. Ainda não foi desta vez que o teatro brasileiro encontrou a saída, as respostas, mas "A Arte da Comédia" faz as perguntas.


Avaliação:    


Peça: A Arte da Comédia
Elenco: Walter Breda, Marcelo Lazzaratto, Newton Moreno
Quando: qui. a sáb, às 21h; dom., às 18h
Onde: teatro Alfa, sala B (r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel. 5693-4000)
Quanto: de R$ 20 a R$ 30


Texto Anterior: Bibi Ferreira inaugura sala em SP
Próximo Texto: Cinema: Unibanco exibe curtas favoritos do público
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.