São Paulo, segunda-feira, 07 de fevereiro de 2005

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CINEMA/CRÍTICA

"Jogos Mortais" usa lógica de "reality show" para criar o terror; sucesso do longa já garantiu continuação

Totalitarismo da imagem percorre thriller

THIAGO STIVALETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O "Big Brother" está mesmo por toda parte. Depois do sucesso da fórmula na televisão, o cinema adotou o totalitarismo da imagem como elemento central de diversos gêneros, do drama ("O Show de Truman", 1998) à comédia ("Entrando numa Fria", 2000) e ao terror ("Halloween: Ressurreição", 2002, em que o imortal Mike Myers ataca os integrantes de um "reality show").
As câmeras ocultas que tudo sabem e tudo vêem também são fundamentais na estratégia do psicopata deste "Jogos Mortais", de James Wan.
As duas vítimas principais, que durante todo o filme ficam acorrentadas em um banheiro infecto, devem seguir as pistas deixadas por ele para ter alguma chance de salvação.
A consciência do olhar escondido, que acompanha cada um de seus movimentos, é fator essencial na elaboração do medo dos personagens.
Anunciado como o melhor filme de "serial killer" desde "Seven" (1995), "Jogos Mortais" tenta mesmo mimetizar a fotografia do thriller de David Fincher, privilegiando os ambientes escuros e sujos, com uma luz que só permite ver o essencial.
A premissa tem lá suas qualidades: enquanto um único espaço concentra a tensão do filme (o tal banheiro onde estão um jovem e um médico acorrentados, tendo entre eles um cadáver desconhecido), o psicopata continua a agir no mundo externo, e um detetive (Danny Glover, o único nome conhecido do elenco) corre em seu encalço.
E a trama, cheia de reviravoltas, mantém o espectador atento até o final -poucos espectadores hão de adivinhar o desfecho.
Mas esse mesmo roteiro que privilegia as viradas súbitas acaba passando por cima dos personagens, que não têm muita consistência e estão lá apenas como peças de um jogo de xadrez habilmente conduzido.
O próprio detetive passa de homem racional no início a louco obcecado por seu alvo sem transição justificada. Por fim, os atores também não ajudam muito, com interpretações esquemáticas e sem energia.
No final das contas, "Jogos Mortais" (que no original se chama "Saw", serrote em inglês) é mais um exemplo de suspense com produção independente que, à força de contar com uma boa idéia, torna-se bem lucrativo.
Custou US$ 1,5 milhão -cerca de R$ 3,9 milhões- para ser produzido (mais US$ 15 milhões de divulgação -cerca de R$ 39 milhões) e, aproveitando o Halloween norte-americano, na estréia em outubro, rendeu US$ 55 milhões -cerca de R$ 143 milhões. A seqüência, claro, já foi anunciada ainda para este ano.
O diretor estreante, o australiano James Wan, tem mesmo futuro como roteirista. Mas ainda precisa aprender a não diluir suas histórias tão bem inventadas em imagens cheias de maneirismos, que trabalham apenas em cima dos códigos óbvios que estamos acostumados a ver em qualquer filme do gênero.


Jogos Mortais
Saw
  
Direção: James Wan
Produção: EUA, 2004
Com: Leigh Whannell, Cary Elwes e Danny Glover

Quando: em cartaz nos cines Eldorado, Marabá, Shopping D, Metrô Santa Cruz 9 e circuito


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