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Lubitsch ganha mostra no CCBB
Cineasta alemão foi um dos maiores nomes da comédia norte-americana
Mostra começa hoje e vai até dia 19, com 15 filmes, entre comédias e musicais, produzidos na Alemanha e nos Estados Unidos
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
A história do primeiro filme
americano de Ernst Lubitsch
pode ser vista como um bom
resumo de sua trajetória de cineasta. Ele havia sido contratado por Mary Pickford e a dirigira em "Rosita", em 1923. Consta que Pickford, então uma superestrela, detestou o que viu e
fuzilou o alemão com uma frase
mortal: "Ele não dirige atores.
Ele dirige portas".
Lubitsch conseguiu se esquivar da condenação: "Rosita" fez
sucesso e ele seguiu sua carreira em Hollywood, onde tornou-se um dos maiores nomes da
comédia americana e ficou famoso pelo "The Lubitsch
Touch", que dá nome ao ciclo
que hoje se inicia no CCBB.
O que é o "Lubitsch Touch"
até hoje se discute. É certo, em
todo caso, que dele fazem parte
a elegância, a ênfase na sexualidade e a sutileza na observação
das relações humanas e de costumes. Além do senso de humor tremendamente desenvolvido, que inclui, naturalmente,
o uso exaustivo de portas.
Nada disso se parece com o
que se poderia esperar de um
diretor alemão nos anos 1920.
De fato, Lubitsch nada tem a
ver com as angústias do expressionismo. Sua carreira começa
durante a Primeira Guerra
Mundial, quando acumula as
funções de comediante bem-sucedido com a direção. Após o
fim da guerra, consagra-se em
várias frentes: por um lado, impõe o estrelato de Pola Negri
em "Olhos da Múmia" (1918),
seu primeiro filme notável; ao
mesmo tempo, destaca-se no
filme de costumes ("Ana Bolena", 1920) e em comédias como
"Princesa das Ostras" (1919).
A mostra do CCBB não demonstrará o fato de Lubitsch
ter sido o primeiro alemão a
exercer forte influência sobre a
produção americana, antes
mesmo de F.W. Murnau. Ela é,
diga-se, bastante lacunar. Abre
mão de clássicos do período
alemão (como "A Boneca" ou
"Mme. DuBarry"), mas traz raridades, como o primeiro filme
de Pola Negri ("Olhos de Múmia") ou "Sapataria Pinkus", de
1916, em que o próprio Lubitsch faz o papel principal.
Da fase americana, a mostra
omite os filmes mudos e o início do sonoro, momento em
que Lubitsch, trabalhando para
a Paramount, contribuiu fortemente para a nova linguagem.
O que veio, no entanto, dá e
sobra: da opereta "A Viúva Alegre" (1934) até "O Pecado de
Cluny Brown" (1946, sua última obra completa), cria-se uma
ideia do que foram os anos do
entre-guerras e do imediato
pós-guerra em termos de gosto,
hábitos e sexualidade. E de política, pois com imenso humor
Lubitsch combateu o nazismo
("Ser ou Não Ser") e soube fazer
rir com a rigidez comunista
("Ninotschka", com Greta Garbo), antes de morrer em 1947,
de ataque cardíaco.
Lubitsch, que era filho de um
alfaiate judeu de Berlim, assinou cerca de 70 filmes como diretor em 33 anos. Nesse tempo,
demonstrou ser ótimo diretor
de atores, apesar da opinião de
Pickford. O que não o impediu,
diga-se, de dirigir muito bem as
portas, que têm papel central
em seus filmes. Elas é que separam o público do privado, duas
instâncias que Lubitsch soube
aproximar com maestria, driblando a censura filme após filmes, sem nunca perder a classe.
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