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TEATRO/CRÍTICA
Obra-prima de Chico Buarque ganha montagem de turma da EAD, que recupera energia da peça
Estudantes reanimam "A Ópera do Malandro"
Divulgação
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Cena da montagem de "A Ópera do Malandro" por turma da EAD |
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Quinta-feira passada: com
a devoção dos carteiros, o
crítico contorna uma deserta e gelada praça do Relógio no campus
da USP na certeza de um espetáculo cancelado por falta de público. Só bem perto que se revela o
improvável: uma pequena multidão se aglomera na porta.
Faz sentido. Nesses dias em que
desfilam cinismos na CPI dos
Correios, é preciso lavar a alma
com essa mistura delicada de deboche e lirismo que é "A Ópera do
Malandro". A obra-prima teatral
de Chico Buarque, de 1978, nunca
deixou de ser montada, mas andou se perdendo em "desconstruções" pedantes ou sendo esterilizada por excessos comerciais. No
teatro estudantil, a "Ópera" está
em casa. Essa turma 55 da Escola
de Arte Dramática, em sua primeira aparição pública, tem a oferecer sua energia contagiante,
uma reserva de personalidades a
serem lapidadas, mas que recebem desde já uma massagem de
ego por uma platéia vibrante.
O espetáculo é meticulosamente embalado, com direito a apoteoses de teatro de revista, um ágil
cenário de José de Anchieta e trocas de figurinos além do que seria
previsível com os R$ 1.000 que a
produtora Bertha Heller soube
multiplicar. Conta também com
uma afiada banda que garante o
som ao vivo e um projeto de luz
belo e eficiente de Denílson Marques e Iacov Hillel, um diretor que
domina o musical como poucos.
Confiando nas gargantas e nas
pernas, que cumprem com molejo marcas e coreografias precisas
de Ana Maria Spyer, o elenco entra como a seleção, confiando nos
talentos individuais, cada qual
brandindo seu cartão de visitas.
E funciona. Já na comissão de
frente vem Lívia Guerra, todo o
Brasil descendo a ribalta, puxando um coro de malandros e prostitutas no qual cada um sabe exatamente quem é e o que faz, com
destaque para a Fichinha de Lívia
Camargo, que alinhava a peça. O
aprumo faz com que Luís Roberto
Soares (delegado Chaves) e Sílvia
Suzy (Vitória, a primeira-dama
da corrupção) superem a pouca
idade para o papel, e se Alexandre
Cruz, no papel central de Duran,
se apóia um pouco demais nos
mesmos trejeitos, acaba remetendo a Zé Trindade, o que não é mal
para essa chanchada cult.
Superam o esperado a Geni de
Luciano Andrey, que fica na sombra até o exuberante solo final, e o
digno Max de Júlio Machado, malandro expressionista. Érika Altimeyer surge como Lúcia, como
um artilheiro que entra no segundo tempo, com o time ganhando
de goleada, e marca seu gol.
Cabe a Ana Maria Martins o
momento inesquecível. Seu solo
de Terezinha, com direito a músicos em campo, é sem dúvida notável. Mas deixa sua marca quando, como não quer nada, cantarola a marcha nupcial com todos os
trejeitos do musical da Broadway,
deixando o teatro Abril despedaçado. Muito deve vir ainda para
essa turma, a aprendizagem da interiorização, da elegância da invisibilidade a serviço de um texto
com outras exigências. Mas garantiram desde já lembranças privilegiadas dessas noites quentes
da "Ópera do Malandro".
A Ópera do Malandro
Onde: Teatro Laboratório ECA - sala
Alfredo Mesquita (av. Prof. Luciano
Gualberto, trav. J, 215, Cidade
Universitária, tel. 3091-4376
Quando: qua. a sáb., às 20h30h; dom., às
19h30. Até o dia 17
Quanto: entrada franca
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