CRÍTICO DA FOLHA

A bandeira (leia-se também capital) de "Sombras do Passado" é alemã, bem como parte da equipe técnica, mas todo o restante -argumento, elenco, locações- é indiano. Em pauta, a tentativa de ser mais realista do que o rei -realizar um filme com as características de Bollywood (a popular indústria cinematográfica da Índia) que fosse ainda mais "bollywoodiano", com um verniz facilitador para o público europeu.
O apelo se alimenta de uma noção estreita de "multiculturalismo", pautada pelo poder de sedução do exótico -que, neste caso, se relaciona não apenas com tradições milenares indianas mas também com a extrema pobreza do país. É como um filme de denúncia, por sinal, que esse drama romântico começa, apresentando a rotina de crianças escravizadas em uma fábrica de tapetes, nos anos 40.
Ravi (Sikandar Agarwal) tem aparência de fragilidade, mas é um dos meninos mais espertos e obstinados do lugar. Prefere comer pouco para economizar o dinheiro que poderá lhe render anos depois a liberdade e, à noite, treina em uma máquina para ter condições de mudar de função. Os planos se alteram quando Masha (Tumpa Das) é vendida pelo pai ao capataz da fábrica.
Ao longo das décadas seguintes, a relação entre os dois (interpretados, como adultos, por Prashant Narayanan e Tanishta Chatterjee) enfrentará percalços típicos de dramas românticos em que tudo conspira contra a felicidade do casal -problemas econômicos, preconceito social, lances do acaso (retomando, entre outras combinatórias do gênero, o tema do encontro marcado, como o que afasta Cary Grant de Deborah Kerr em "Tarde Demais para Esquecer").
O segundo longa-metragem na direção (e o primeiro solo) de Florian Gallenberger, vencedor do Oscar 2001 de melhor curta-metragem com o germano-mexicano "Quiero Ser", tanto faz para criar emoção a partir da interminável sucessão de percalços que, a certa altura de suas duas horas, embaladas por tema musical reiterativo, Ravi e Masha se tornam apenas involuntária caricatura de amantes infelizes. (SR)

SOMBRAS DO PASSADO  
Direção: Florian Gallenberger
Produção: Alemanha, 2004
Com: Tanishta Chatterjee, Prashant Narayanan

Texto Anterior: Documentário faz retrato amargo de cidade mudada
Índice