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CINEMA/CRÍTICA
"O Signo de Leão", primeiro filme do diretor, traz enfoque pouco usual no cinema francês sobre Paris
Eric Rohmer dribla o fetiche do cartão-postal
PAULO SANTOS LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Não há dúvida que a câmera
na rua foi a grande intersecção entre as diversas propostas estéticas da nouvelle vague num primeiro momento, quando os cineastas saídos da "Cahiers du Cinéma" usaram o espaço como
ponto de partida para a experiência fílmica. Este espaço, antes cenário e agora locação, era uma Paris mais "real" (na concepção baziniana, escorada no neo-realismo)
e por isso inédita. "O Signo de
Leão" (59), primeiro longa de Eric
Rohmer, ainda que mais "comedido" na forma que Godard ou Resnais, transgrediu politicamente ao
atentar contra a mítica belle époque da Paris cidade-luz.
Se nas obras posteriores do diretor o deslocamento espacial seria o
rotor para os personagens pensarem (e falarem) sobre eles próprios, como em frente ao espelho,
neste filme o trânsito mais ilustra
uma relação entre personagem e
espaço, como olhando por uma
lupa.
A "missão de reconhecimento" é
empreendida por Pierre (Jess
Hahn), e na marra, já que o músico gastou os tubos ao receber a notícia sobre uma herança destinada
a outro parente. Tal qual um artista aristocrata, Pierre nunca trabalhou e sempre viveu do mecenato
de amigos. Só que estes estão em
férias e, para piorar o drama, as
pessoas e a Paris de agora não se
interessam por valores abstratos e
pretéritos como nobreza e arte.
Sem moradia, Pierre cria uma
outra relação com a cidade, em caminhadas quilométricas e acompanhadas por uma câmera que registra as coisas quase como um filme neo-realista, ou seja, tentando
captar o "real" e as suas várias camadas.
Já na mendicância, a horas tantas, e dormindo na rua, Pierre (pedra, em francês) já parece fundido
no patrimônio arquitetônico da
cidade. E vocifera contra os casais
de turistas apaixonados, a burguesia, o calor do verão, as obras que
perderam o sentido para ele, os
passeios às margens do Sena. Os
novos tempos, mais burgueses do
que nobres, o desagradam.
A ambigüidade criada pelos vários registros, típica na obra de
Rohmer para chegar mais próximo do real, cria certo mal-estar na
relação entre o espectador e a Paris
da tela. O que decretou o fracasso
comercial do filme. O mais notável, contudo, é que mesmo esteticamente menos "radical" na forma que seus colegas, Rohmer foi o
único dos cineastas modernos
deste período natalino da nouvelle
vague que não sucumbiu a uma
certa visão fetichista de Paris. Mesmo Jean-Luc Godard levaria anos
para montar um viés assustador a
partir de Paris, com o seu filme
"Alphaville", no ano de 1965.
O Signo de Leão
Le Signe du Lion
Produção: França, 1959
Direção: Eric Rohmer
Com: Jess Hahn, Michèle Girardon
Onde: em cartaz no Top Cine 2
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