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Moradores interagem com criação
DA REPORTAGEM LOCAL
Há dois domingos, a Folha
acompanhou um ensaio aberto
de "Hygiene". Enquanto um morador fez questão de carregar o filho nas costas durante as cenas
externas, uma outra vizinha se
queixou da presença do "teatro"
na Vila Operária Maria Zélia.
"O grupo tem apelo, consegue
interagir com os moradores, apesar de muitos ainda não se sensibilizarem", diz Wagner Vargas
Legnini, 54, presidente da Associação Amigos da Vila Maria Zélia. Ele estava acompanhado do filho Kavan, 4.
"A peça deles [do grupo XIX de
Teatro] é meio fraquinha, deveria
ser mais bem produzida", diz
Leonor Mota Conde, 73, que nunca foi ao teatro e tomou as intervenções de rua como "simplistas". Apesar da crítica, ela, que estava de passagem, se deixou levar
por algumas cenas depois de conversar com a reportagem.
Nascida na vila, Eride Albertini,
52, ficou tão empolgada com a
"criatividade" do grupo que juntou-se a ele. Conhecedora das artes da marcenaria (tem uma oficina em casa), construiu uma máquina fotográfica nos moldes daquelas dos velhos lambe-lambe,
em madeira, com tripé alto, equipamento que é visto logo na primeira cena, em frente à capela.
"O teatro é uma luz, prova que é
possível ocupar a vila com cultura", diz Albertini.
"Eles [os artistas] puseram sangue novo numa coisa que estava
adormecida", afirma Edelcio Pereira Pinto, 56, também nascido
na vila.
Nos ensaios, os moradores também trouxeram objetos pessoais e
deram dicas, entre as quais a incorporação de bambus e varais
em algumas cenas, como na época das lavadeiras locais.
Fidelidade
Quanto à concepção cenográfica, o grupo procurou dialogar
com o máximo de fidelidade aos
espaços como eles são.
"Além de ocupar o espaço como
memória, assumimos as interferências da criança que passa no
meio da cena, de bicicleta, ou
mesmo dos ruídos externos, como as buzinas dos carros da vila",
diz o arquiteto Renato Bolelli, 25,
que assina seu primeiro trabalho
no grupo.
Durante a residência, a equipe
do XIX de Teatro organizou debates com especialistas em moradia,
arquitetos e organizações sociais
ligadas aos sem-teto.
Uma das primeiras intervenções artísticas foi "A Vila Imita a
Arte, a Arte Imita a Vila".
Exibiu filmes como "Narradores de Javé", de Eliana Caffé, sobre
uma comunidade que tem na oralidade a única forma de preservar
sua existência -do contrário será
inundada para a construção de
uma usina hidrelétrica.
Fez curta temporada de "Hysteria" no antigo armazém da vila,
também "resgatado". Moradores
locais choravam ao entrar neste
ou em outros prédios públicos até
então fechados. Lembravam da
infância.
A Escola dos Meninos, por
exemplo, que recebe "Hygiene",
estava tomada pelo mato e foi capinada pelos atores e técnicos do
grupo, com a ajuda de alguns moradores.
(VS)
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