São Paulo, sábado, 13 de novembro de 2010

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CRÍTICA DRAMA

Espetáculo retrata conflitos políticos com viés íntimo

CHRISTIANE RIERA
CRÍTICA DA FOLHA

O ponto de partida de "Cidade Desmanche", espetáculo criado pelo talentoso coletivo Teatro de Narradores, sob direção de José Fernando de Azevedo, é um boteco no bairro da Bela Vista onde uma banda anima folia liderada por alguns atores que dançam com o público.
Do outro lado da rua, está o Espaço Maquinaria, sala de ensaio do grupo e palco dessa ambiciosa montagem.
"Esse lugar será a sua pátria", introduz um ator, deixando claro o paralelo entre a situação política do país e a travessia que se fará pelo casarão "em desmanche".
O público segue um ex-presidiário (Marcelo Valente) em sua volta para casa, missão impossível, uma vez que "estão demolindo tudo para construir um shopping".
Na primeira parada dessa procissão, três camas funcionam como micropalcos. É nesse lugar que está prestes a não existir mais que se desenrola uma narrativa em fragmentos, através de historietas cujos personagens são apresentados lentamente e conectados pelo fato de que todos se encontram em estado de exceção.
No quebra-cabeça narrativo, as peças se encaixam por uma lógica de desintegração. Em sequência de cenas poéticas, algumas se destacam por sutileza bela. Uma prostituta exala dignidade e firmeza (Lucélia Sérgio) ao observar a cidade pela janela, afundada na paisagem.
Em outro momento lírico, um discurso sobre os últimos anos no cortiço culmina com a música "Não Deixe o Samba Morrer" ao mesmo tempo em que um vídeo retrata, com imagens documentais, a desocupação de um cortiço.
A tentativa de abordagem política por um viés mais íntimo funciona quando assume os dramas como espaços de ruptura, sem possibilidade de conexão além da projeção de sonhos não conquistados.
No final do espetáculo, porém, a trama foca um ator que ensaia para teste, ação que escorrega para cenas seguintes, em que, no topo do prédio, ele repete seu texto.
Se "política tem a ver com esperança", como é dito, ao tentar cristalizá-la, a montagem se desmancha. É mais bem-sucedida ao retratar a indeterminação de um tempo político que gira em falso, falido e morto.

CIDADE DESMANCHE

QUANDO sáb., às 21h; dom., às 20h; até 12/12
ONDE Espaço Maquinaria (r. Treze de Maio, 240; tel. 3853-3651)
QUANTO de R$ 5 a R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO regular


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