São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

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Projetos de resgate da cultura popular em São Paulo unem velha e nova gerações de músicos de chorinho e samba

Meninos não choram?

Matuiti Mayezo/Folha Imagem
Em destaque, Marina Morena, 11 anos, solista do grupo Toca do Coelho


DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Engana-se quem pensa que o chorinho está com os seus dias contados, que vai ficar confinado ao repertório dos poucos veteranos que ainda se arriscam pelos palcos dos país relembrando sucessos de Pixinguinha, Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga.
Uma simples orelhada em dois projetos de resgate da música popular brasileira, o Cultura de Boteco e a Praça do Choro, que acontecem todos os domingos em áreas públicas da cidade, comprova que o gênero vem sendo premiado com uma boa dose de sangue novo, que tem dividido, sem tremer, as atenções com veteranos do choro e do samba.
"Precisamos devolver a nossa música de raiz ao público na rua. Infelizmente são poucas as crianças que, hoje, têm o privilégio de ouvir em casa uma música como o choro", afirma Celsinho de Oliveira, 53, coordenador do Cultura de Boteco, roda de choro e samba que acontece aos finais de semana no coreto da Praça da República.
Marina Moreno, 11 anos, cavaco solo do grupo mirim Toca do Coelho, não deixa dúvida quando perguntada sobre o que gosta de ouvir: "Samba e chorinho".
Atração deste e do último domingo na República, o trio de chorões tem ainda a irmã Vitória, 9, no tan-tan, e o primo Henrique, 10, no pandeiro. "A gente ensaia bastante no final de semana. Às vezes, dá um pouquinho de preguiça, mas tem que continuar", conta Marina, que aprendeu a tocar com o pai e começou a se apresentar em 1999.
E não são só os pequenos que mostram o que sabem dentro do projeto. Além da roda de sambistas e músicos habitués da noite paulistana, Celsinho de Oliveira -ou Celsinho da Cuíca- costuma receber convidados especiais, dentre os quais o cantor Jessé, que deu uma canja por lá na semana passada. "Eles são os excluídos do sistema atual. Continuam produzindo até hoje, mas a indústria fonográfica não dá mais bola", critica o coordenador do projeto.
Falando em excluídos, o evento costuma proporcionar uma inusitada mistura ao longo de suas quase quatro horas de samba e choro: enquanto turistas, engravatados e classe média observam curiosos, a uma certa distância, crianças e moradores de rua da região desfrutam um dos poucos momentos de descontração de sua rotina diária, dançando e cantando ao som de "Saudosa Maloca" ou "Trem das Onze", de Adoniran Barbosa.

Pioneiros
De cultura na rua outra autoridade é Jane do Bandolim, 40. Iniciada no samba profissional aos 18 anos, quando começou a se apresentar na rua João Moura, em Pinheiros, Jane é hoje a principal figura por trás da Praça do Choro, que tem animado há dois anos os domingos da praça Júlio Prestes.
"Conseguimos diversificar bastante o público. Agora vem gente de outros bairros e até de fora de São Paulo", comemora. "Temos a tradição de aliar nomes consagrados, como Altamiro Carrilho e Toco Preto do Cavaco, à revelações da cena, como o garoto Pingo e o grupo Choro Moleque."
A praça tem hoje o sambista Valdyr Fonseca, o grupo Nosso Choro e as meninas do Arirê.


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