|
Texto Anterior | Índice
FESTIVAL DE DOCUMENTÁRIOS É TUDO VERDADE
"Samba Riachão" celebra e explica a música da Bahia
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Clementino Rodrigues é
um negro franzino e sorridente que, aos 80 anos, parece ter
50. Em geral veste terno branco,
camisa aberta ao peito e lenços de
cores berrantes, além de uma indefectível toalhinha nos ombros,
que ele usa para enxugar o suor
abundante do rosto.
Com o nome artístico de Riachão, esse pequeno baiano compôs centenas de músicas simples e
deliciosas cantadas por várias gerações nas ruas de Salvador. Algumas delas foram difundidas nacionalmente por intérpretes famosos. É o caso de "Cada Macaco
no Seu Galho", gravada duas vezes por Gil e Caetano.
Em torno desse personagem, o
cineasta e músico Jorge Alfredo
fez um documentário vibrante sobre a história do samba baiano.
"Samba Riachão" dividiu com
"Lavoura Arcaica" o prêmio de
melhor filme no último Festival
de Brasília, e a presença do sambista encantou o público do evento. Foi a consagração tardia de um
artista ainda pouco conhecido fora da Bahia.
O mérito maior do documentário de Jorge Alfredo é o de equilibrar admiravelmente informação
e homenagem, reflexão e festa, logos e eros. De Dorival Caymmi a
Carlinhos Brown, passando por
Caetano, Gil e Tom Zé, os músicos e compositores mais importantes da Bahia dão depoimentos
preciosos procurando explicar a
originalidade do samba baiano e
suas relações com outros ritmos
afro-brasileiros.
Entremeadas a esses depoimentos -em geral filmados de modo
espontâneo e pouco convencional-, vemos imagens de arquivo
(poucas) e cenas da vida cotidiana
de Riachão. O próprio compositor nos revela a gênese de alguns
de seus sambas e fala sobre os
eventos mais marcantes de sua
biografia enquanto veste seu terno, mostra fotos antigas ou caminha pelas ruas da velha Bahia.
Um dos momentos mais belos
do filme é aquele em que a câmera
acompanha, com muita leveza,
uma caminhada de Riachão por
uma ladeira de Salvador, em direção à cidade baixa.
Ele pára aqui e ali para brincar
com fãs, ensaia passos de samba,
entoa canções, sorri o tempo todo. Vida e música são uma coisa
só, numa festa sem fim.
"Samba Riachão" nos coloca no
meio dessa festa, ao mesmo tempo que nos faz pensar sobre ela.
Para o bem ou para o mal, saímos
desse filme mais brasileiros. Não é
pouca coisa.
Samba Riachão
Direção: Jorge Alfredo
Produção: Brasil, 2001
Onde: hoje, às 18h30, no CCBB; amanhã,
às 19h, no Centro Cultural SP
Texto Anterior: Teatro: Temporadas experimentais invadem semana Índice
|