São Paulo, Quinta-feira, 16 de Dezembro de 1999


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TEATRO
A australiana Joanna Murray-Smith, autora da peça que traz Regina Duarte no elenco, fala à Folha
Peça "Honra" ganha sessões extras


SHEILA GRECCO
da Redação

Depois de 32 anos de casamento, Guilherme decide abandonar a família para viver um romance com Cláudia, uma jovem jornalista. A história é velha conhecida, mas tem rodado o mundo como o enredo de "Honra", peça da australiana Joanna Murray-Smith. No Brasil, a temporada termina nesta semana com sucesso, fazendo algumas sessões extras.
A peça já teve leituras e montagens nos EUA, Austrália, França, Alemanha, México, Turquia, Malásia, Hong Kong, Japão. "Trato de temas clássicos sob uma nova linguagem. Todos estão preocupados com saídas para o amor, a dor e o prazer da existência humana", disse a autora à Folha.
Nascida em Melbourne, Joanna Murray-Smith escreve romances, peças e roteiros de cinema. "Hon- ra" estreou na Austrália em 1996 e, no mesmo ano, foi lida por Meryl Streep em Nova York. Em 1998, foi produzida na Broadway. Além dos palcos brasileiros, com produção da atriz Regina Duarte, "Honra" deve estrear em Tóquio.
Bem-humorada e entusiasmada com a receptividade de seu trabalho no Brasil, Joanna Murray-Smith falou à Folha de crises familiares (tema pelo qual tem fascínio) e de seus planos, que incluem uma viagem ao Brasil para assistir à estréia da peça provavelmente no Rio no próximo ano.

Folha - Onde estaria em "Hon- ra" a originalidade de contar a já tão conhecida história de um homem que se apaixona por uma mulher mais velha?
Joanna Murray-Smith -
Quis contar uma história bastante familiar sob uma nova linguagem. A originalidade está em colocar a mulher como personagem central e não usualmente nas arestas da história. Quis fazer isso sem reduzir as personagens a estereótipos. Queria construir uma história em que a presença de cada um dos quatro personagens fossem também representações das facetas do ser humano.

Folha - Os críticos têm dito que você faz uma boa mistura entre palco e roteiro. Celso Nunes, o diretor de sua peça no Brasil, afirma que "Honra" é para ser dita e não lida. Como você define sua linguagem?
Murray-Smith -
O roteiro foi construído de modo a ser dito e não lido. É extremamente gratificante para o dramaturgo quando a encenação no palco traz essa naturalidade que uma leitura do "script" aparentemente não traz. A minha linguagem é bastante peculiar, traz pensamentos inacabados na boca dos autores, deixando suspenso no ar uma tensão. A minha ambição é escrever um texto provocativo e lírico.

Folha - Freud dizia que a satisfação sexual é a mais forte e importante para a felicidade do ser humano. Guilherme, em sua peça, parte nessa direção?
Murray-Smith -
Sim, ele assume este ponto de vista tipicamente freudiano. Ele vai lutar para defender que a paixão física não pode ser negada. Obviamente isso se choca com outros pontos de vista, para quem sexo e amor fazem parte de uma complexa mistura. E disso vai se dar conta Guilherme no final da peça. A paixão é necessária para impulsionar a existência humana, mas por si só não sustenta um relacionamento.

Folha - Norah abandona sua promissora carreira como escritora para viver em função do marido. Cláudia, quando começa a se tornar conhecida, vê seu relacionamento com o amante entrar em conflito. Você acredita que os as grandes mulheres atemorizam os homens?
Murray-Smith -
As feministas me matarão ao ouvir isso (risos), mas é verdadeiro que homens sentem complexo intelectual ao se deparar com grandes talentos dentro de casa. Em "Honra", parte daquilo de que foge Guilherme está explicada no fato de que Norah compreende muito bem todas as suas nuances, medos e falhas. Guilherme quer correr disso e começar de novo. Para muitos homens dessa idade inteligência intelectual passa a ser um conceito raso. Cláudia dá a Guilherme a chance de escapar não só da mulher, mas de si próprio.

Folha - A emancipação das mulheres no século 20 é impressionante. No entanto, a protagonista Norah vai na contramão desse perfil moderno. Você não sentiu medo das feministas?
Murray-Smith -
Claro que fiquei aterrorizada com essa possibilidade, mas uma infinidade de feministas assistiu à peça e gostou. Acredito que o que influencia a peça é o meu sentimento de que as duas gerações erraram em algum aspecto. A geração de Norah se deu demais e a geração moderna, muito pouco.

Folha - Algum dramaturgo em especial teria a influenciado?
Murray-Smith -
Amor, morte, traição, desejo, ambição são elementos presentes desde as narrativas dos gregos. Tchecov me ensinou particularmente como idéias se transformam em teatro.

Folha - "Nightfall", sua última peça, conta a história de Cora, uma protegida criança que desaparece sem deixar rastros. "Honra" também mostra uma crise familiar. Por quê?
Murray-Smith -
Sou fascinada por famílias e gosto de escrever peças com um número reduzido de personagens, em situações de intensa emoção, e a família acaba servindo como pretexto ideal. Há muito de materialidade, drama, dor e confusão na família.


Peça: Honra Elenco: Regina Duarte, Gabriela Duarte, Carolina Ferraz, Marcos Caruso Onde: teatro Cultura Artística (r. Nestor Pestana,196, tel.: 258-3616)
Quando: hoje, às 18h e às 21h, e amanhã sessões extras no mesmo horário Quanto: R$ 30


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