São Paulo, sábado, 16 de dezembro de 2006

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Crítica/cinema/"Marcello, Uma Vida Doce"

Rico acervo de imagens valoriza tributo ao mito Marcello Mastroianni

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

A aura em torno de astros e estrelas de cinema já rendeu documentários notáveis como "Marlene" (1984), em que o também ator Maximilian Schell tenta se aproximar do mito Marlene Dietrich (1901-1992), e "Meu Melhor Inimigo" (1999), no qual o diretor Werner Herzog reconstitui sua vida (e as muitas diferenças) com Klaus Kinski (1926-1991).
"Marcello, Uma Vida Doce" pertence a outra família, de realização mais modesta, sem maiores pretensões exceto a de prestar tributo à memória do homenageado. Ocorre que o homenageado vem a ser Marcello Mastroianni (1924-1996) -e não haveria como deixar de fazer um filme iluminado, tendo como foco esse ícone de elegância, magnetismo e simpatia.
A produtora italiana Surf Film, que realizou o longa, já assinou documentários sobre outras figuras-chave do cinema italiano, como a atriz Sophia Loren e o roteirista Tonino Guerra, bem como sobre as filmagens de "Diários de Motocicleta" (2004), de Walter Salles, e sobre o líder cubano Fidel Castro. É também a distribuidora de diversos filmes de Mastroianni, como "Matrimônio à Italiana" (1964), "Casanova 70" (1965) e "Um Dia Muito Especial" (1977).
O tom é sempre respeitoso, quase oficial, como se qualquer insinuação de desvio pessoal ou profissional fosse atingir um símbolo da pátria, mas o acervo de imagens tem valor inestimável. Além de trechos de cerca de 20 filmes ("A Doce Vida", apesar do título, só aparece em fotos), há preciosas entrevistas de arquivo, inclusive com diretores também já falecidos, como Federico Fellini, Luchino Visconti e Valerio Zurlini.
O material de arquivo é enriquecido pelo achado que abre o filme e o costura: cenas de Mastroianni aos 41 anos, captadas por Antonello Branca para um documentário. Em meados da década de 60, ele tinha rodado metade de seus cerca de 150 filmes e já era um mito.
O que se vê e ouve, no entanto, é alguém que procura redimensionar a própria importância, embora tenha plena consciência do fascínio que exerce sobre o grande público.
Os diretores Mario Canale e Annarosa Morri juntam a essas imagens outras 25 entrevistas feitas recentemente, e que se dividem em categorias distintas. Entre os destaques, há dois depoimentos do círculo familiar: os das filhas Barbara (do único casamento, com Flora Carabella, que durou até a morte de Mastroianni) e Chiara (do relacionamento com Catherine Deneuve).
A presença de ambas, sem nenhuma menção às mães, ilustra o respeito a certas barreiras que o filme não quer transpor a nenhum custo, nem mesmo diante de informações cifradas que fornecem sobre a distância entre elas.
De um círculo também íntimo, vêm os relatos de alguns colegas de trabalho, como o músico Armando Trovaioli (que traduz Mastroianni em forma de canção) e os diretores Ettore Scola, Mario Monicelli e Marco Bellocchio.
No próximo dia 19, data que marca o décimo aniversário da morte de Mastroianni, "Marcello, uma Vida Doce" ganhará exibição em um auditório de Roma e, à noite, transmitido pela televisão italiana. Seu uso em agenda de homenagens, da qual São Paulo poderá agora fazer parte, só confirma que o espírito é mesmo o de recordar como nós o amávamos tanto e temos saudade, dele e daqueles tempos.


MARCELLO, UMA VIDA DOCE   
Direção: Mario Canale e Annarosa Morri
Onde: Frei Caneca Unibanco Arteplex e Reserva Cultural


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