São Paulo, segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Texto Anterior | Índice

Crítica/"Olho de Boi"

Direção de atores se impõe e ofusca outras qualidades de longa nacional

Iatã Canabrava/Divulgação
Gustavo Machado (ao fundo) e Genézio de Barros no filme

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Desde a conversão da história de Édipo em complexo, operada pela psicanálise, o alcance universal do mito grego que envolve incesto e parricídio nunca deixou de se expandir e de ganhar versões e reinterpretações.
No cinema, a representação da tragédia de Sófocles feita em 1967, na qual Pasolini sobrepôs o arcaico ao contemporâneo, mantém sua beleza intacta. Agora, quem retorna ao tema de um modo enviesado e não sem interesse é um cineasta brasileiro cujo currículo já registrava uma rigorosa adaptação, a do romance "Sargento Getúlio", de João Ubaldo Ribeiro, em sua estréia na direção, em 1983.
O deslocamento principal é do universo da "pólis" grega para o mundo rural brasileiro, com seu linguajar local fidedignamente traduzido para a tela. Já papéis e ações também sofrem reinterpretações e mudanças de ênfases, com um personagem edipiano mais astucioso e uma figura paterna onipresente.
A notável direção de atores demonstrada por Hermano Penna desde seu primeiro trabalho e nos dois longas de ficção que realizou posteriormente continua sendo a qualidade mais explícita de "Olho de Boi".
O foco do drama pouco se descola do magnetismo exercido pela dupla de atores, Genézio de Barros e Gustavo Machado (premiado em Gramado em 2007), que fazem o fazendeiro Modesto e seu afilhado, o peão Cirineu, respectivamente.
Em meio à natureza ou dentro dos escombros de uma velha igreja, Modesto e Cirineu encenam um intenso duelo verbal no qual temas como desejo e crime, sexualidade e morte se entrelaçam, tornando evidentes certas razões que costumam se manter obscuras. Este movimento de "trazer à luz" ganha força no avanço dramático do filme, que começa no escuro e atinge seu ápice em pleno dia.
Por outro lado, mesmo que o cineasta trace com a câmera e o uso expressivo da luz belos planos em movimento em torno de seus personagens, o modo de encenar prioriza a teatralidade, efeito do talento oral com que seus atores executam as falas do bom roteiro.
De tão onipresente e acima das outras, esta qualidade se impõe de um modo que acaba parecendo ser a única.

Avaliação: regular


Texto Anterior: Exposição: Clube Hebraica abre hoje Salão de Arte 2008
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.