São Paulo, terça-feira, 20 de agosto de 2002

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ARTES VISUAIS

Com curadoria de Eduardo Brandão, galeria expõe individuais de Odires Mlászho e Paulo D'Alessandro

Artista morre e renasce em duas séries

Odires Mlászho/Divulgação
Obra que integra a série 'Mortal Coil'do artista Odires Mlászho, que está exposta na galeria Vermelho, que também mostra o trabalho de Paulo D'Alessandro


EDER CHIODETTO
EDITOR DE FOTOGRAFIA

Fotografias que ora se ocultam, ora se revelam a olhos atentos. Imagens que se organizam em camadas, sobre as quais o olhar precisa realizar uma espécie de escavação para alcançar seu intento. Esse é um possível elo entre as obras de Odires Mlászho e Paulo D'Alessandro, em exposição na Galeria Vermelho.
Sob o título "A Palidez Iluminada", Odires reúne parte de duas séries recentes de sua obra. Criador compulsivo, o artista não é propriamente um fotógrafo. Ele utiliza a fotografia apenas para registrar apropriações e intervenções em retratos adquiridos em brechós. Em seu estúdio, onde há uma espécie de mesa cirúrgica, com estiletes, tesouras e vários outros objetos com os quais opera alterações nessas antigas fotografias, cria boa parte de sua mitologia, sucesso entre galeristas e colecionadores.
Na presente mostra Odires apresenta "Animal Farejando Teu Sono", na qual retratos de personalidades como Kant, Schiller e Bach foram cobertos irregularmente por parafina derretida, ervas e flores desidratadas. Aqueles pequenos retratos que ornam túmulos, em ambientes envoltos por vela e flores são a primeira correspondência que se pode encontrar. Daí associa-se uma metalinguagem macabra entre a morte da fotografia (registro do passado), das fotografias de brechó (cemitério de objetos), das flores secas e assim por diante.
Nada, ou quase nada, parece sobreviver na mesa cirúrgica do artista, ainda que a reinvenção das imagens seja uma forma de ressurreição. Mas todas essas questões Odires já havia salientado de forma mais contundente em séries anteriores, como em "A Antecâmara da Máscara". "Animal Farejando Teu Sono" soa como momento de estagnação, de auto-referência. A hora de dar um salto em outra direção. Os recursos simples e surpreendentes que marcam sua obra parecem ter, nesse trabalho, rodado em falso. A justaposição de retratos, parafina e vegetais não são capazes de criar o combustível necessário para que a obra se descole da aparente necessidade de "causar um efeito". Ironia: ao enveredar pela metalinguagem da morte, o artista acabou sendo vitimado em sua própria mesa cirúrgica.
A tese de que esse pode ter sido um momento limítrofe para o artista é "Mortal Coil", a segunda série da mostra que aponta para um universo novo e inesperado. Odires ressurge com frescor. São imagens de sabonetes ampliadas em grandes dimensões. Marcados pelo uso, desgastados pelo contato com a pele, ressecados pelo abandono... Eis aí o olho, a mente e o coração do artista em nova sintonia para consagrar em poesia visual o banal, o corriqueiro da vida.

Desconstrução
D'Alessandro ocupa a parte superior da galeria com justaposições de imagens onde se alternam canteiros de obras e ruínas de cidades como São Paulo, Roma, Pompéia e Brasília.
O autor se utiliza do binômio construção/destruição que tanto serve para fixar a idéia da passagem do tempo, como para refletir sobre noções vastas como progresso, capital e atitude do homem moderno diante do espaço social. Trata-se de um trabalho em progresso onde ironia e temática político-social estão melhor balanceadas que o acabamento formal de algumas obras.
Um mural na fachada da galeria, concebido por Lia Chaia com sorrisos extraídos de revistas de celebridades, recebe os visitantes durante a exibição da mostra. Há ainda quatro transparências de Edouard Fraipont reunidas numa pequena sala interna.


Odires Mlászho e Paulo D'Alessandro   
Quando: até 14 de setembro; ter. a sex. das 10h às 19h, sáb. das 10h às 17h
Onde: galeria Vermelho (r. Minas Gerais, 350, 0/xx/11/3257-2033)
Quanto: grátis
Obras: de R$ 3,5 a R$ 6 mil




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