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CINEMA
Cinemateca passa hoje filme de Grigory Kozyntsev, que mostra que até comunistas se renderam a Shakespeare
"Hamlet" soviético é exibido hoje
PAULO SANTOS LIMA
free-lance para a Folha
A obra mais conhecida de William Shakespeare é exibida hoje
numa versão que nem todos conhecem ou esperavam conhecer.
"Hamlet", produção soviética de
1964 dirigida por Grigory Kozyntsev, integra o ciclo Teatro, Cinema
e Psicanálise, promovido pela Sala
Cinemateca em parceria com a Sociedade Brasileira de Psicanálise.
Após a exibição do filme, o psicanalista Luis Carlos Menezes e o crítico e professor de Letras da USP
José Miguel Wisnik -mediados
pelo também psicanalista Uracy
Simões- abrem mesa-redonda
para discutir o filme e a obra do
dramaturgo inglês.
Enganam-se os que esperam ver
um filme de técnica rústica. Antes
de qualquer metáfora política,
"Hamlet" ("Gamlet", em russo), é
uma adaptação em princípio fiel
ao texto original. Há, ainda, um rigor estético e narrativo como pouco se vê nessas transposições.
Como no original, Hamlet é o
príncipe que ouve o fantasma de
seu pai pedindo vingança por ter
sido assassinado pelo irmão, que
assumiu o trono da Dinamarca.
O problema é que o jovem príncipe (Innokenti Smoktunovsky,
ator de prestígio na época, mas,
convenhamos, com 39 anos, um
tanto velho para o papel) não sabe
como viabilizar a vingança, uma
vez que não há provas fáceis que
incriminem seu tio. Outra questão:
sua mãe, Gertrudes, traiu o rei com
o cunhado.
Quem é culpado, o quanto é culpado e o quanto a natureza humana contribuiu para esse e outros
crimes é o dilema que faz de Hamlet um louco para os cortesãos.
Não é só. Junto a traições de amigos -o único confiável é Horácio- e tentativas de assassinato,
ele ainda nutre um amor tortuoso
por Ofélia (a bela Anastasiya Vertinskaya), mulher que cai na verdadeira loucura, aquela que leva à
destruição.
Apesar de parecer um filme dos
anos 50, o "Hamlet" soviético possui fotografia e cenografia adequadas, simples e cumprindo a caracterização do texto. O diretor não o
rodou como teatro-filmado, ao
contrário, mantém uma câmera
sempre em panorâmicas e travel-lings, instigando o olhar do espectador que mais se ateria ao discurso da obra shakespeareana.
Adaptações de "Hamlet" não faltam. Pelo menos 25 versões "fiéis"
existem -do "Hamlet" de Clement Maurice (1900) ao "Hamlet"
de Michael Almereyda (99), passando pelos ótimos "Hamlet" de
Laurence Olivier (48) e de Kenneth
Branagh (96) e o péssimo de Franco Zeffirelli (90).
O que só fortalece a leitura de
Grigory Kozyntsev. Basta a última
sequência, que mostra o protagonista carregado por espadas.
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