São Paulo, terça-feira, 22 de fevereiro de 2005

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CINEMA

Evento no Centro Cultural Banco do Brasil exibe filmes e sedia debates sobre os 20 anos da empresa cinematográfica

Mostra discute o legado da Embrafilme

TEREZA NOVAES
DA REPORTAGEM LOCAL

Durante as décadas de 1970 e 1980, praticamente toda a produção do cinema brasileiro passou pela Embrafilme, a empresa de economia mista que comandava a distribuição e financiava boa parte dos títulos nacionais.
"Não era monopolista por razões de Estado, como a Petrobras, por exemplo. Mas acabou se tornando de fato", afirma Carlos Augusto Calil, que hoje dirige o Centro Cultural São Paulo e trabalhou como diretor na Empresa Brasileira de Filmes S.A. de 1979 a 86.
É por isso que quase tudo o que foi feito (de bom e de ruim) no cinema brasileiro, entre o final de 1969 e o começo de 1990, quando a empresa foi extinta, teve o selo da Embrafilme.
Em mostra que começa hoje, o Centro Cultural Banco do Brasil de SP revê o legado e alguns dos marcos da produção do período.
São 31 filmes (21 longas, três médias e sete curtas), escolhidos pelos curadores Francisco Cesar Filho e Reinaldo Cardenuto Filho.
A programação (veja ao lado) inclui ainda quatro debates com participação de três ex-diretores: Calil, o cineasta Roberto Farias e Gustavo Dahl, atual diretor-presidente da Ancine (Agência Nacional do Cinema).
Entre os temas, estão a história da empresa e as relações entre a Embrafilme e a atual política audiovisual do país.

Adaptação literária
A Embrafilme surgiu como braço do Instituto Nacional do Cinema (INC). Setenta por cento de suas ações eram do governo e o restante de outras entidades e sócios minoritários, entre eles o produtor Luiz Carlos Barreto.
Logo após sua criação, em 1970, ela se tornou responsável também pelo fomento e, apenas em 1973, passaria à distribuição.
Na mesma época, houve uma tentativa do regime militar de amenizar o conteúdo político dos filmes. "O governo definiu que adaptação literária seria "melhor", porque achava que assim correria menos risco de crítica. Mas "São Bernardo" foi muito incômodo mesmo sendo baseado em Graciliano Ramos", comenta Calil.
Quando Farias assumiu o comando da empresa, em 1974, começou um novo ciclo. A Embrafilme teve seus poderes ampliados e entrou para a produção.
"A atividade cinematográfica é de alto risco. Está nos manuais. A Embrafilme assumia o risco sob forma de associação na co-produção", conta Dahl.

Laranja
Nos anos seguintes, a empresa capitalizou grandes sucessos como "A Dama do Lotação", que é exibido na mostra no dia 4.
"O diretor [Neville d'Almeida] era ligado ao cinema marginal, mas fez um best-seller. Isso tinha a ver com o fenômeno da Sônia Braga, porque o filme veio logo após "Gabriela'", explica Calil.
Segundo ele, outro campeão de bilheteria, "Pixote, a Lei do Mais Fraco", que abre a programação da mostra hoje, às 15h, teve uma boa carreira graças à distribuidora.
"O filme chegou à Embrafilme com o título "O Mundo É Redondo como uma Laranja" e mudou de nome por sugestão da Embrafilme", conta Calil.
O filme de Hector Babenco foi o primeiro a ser disputado em uma espécie de leilão pelos exibidores por ser altamente competitivo.
Outro caso curioso é o documentário "Cabra Marcado para Morrer". O diretor Eduardo Coutinho estava na mira do SNI (Serviço Nacional de Informações) e recebeu dinheiro indiretamente da Embrafilme.
Calil lembra: "A empresa comprou o direito da obra de Vladimir Carvalho para que ele pudesse repassar o dinheiro ao Coutinho, que era seu amigo".
Já "Pra Frente, Brasil", filme dirigido por Roberto Farias em 82, derrubou Celso Amorim, então presidente da empresa.
"Na época, a tortura ainda não era um assunto suficientemente sedimentado. Havia uma perspectiva de que seria possível reverter a abertura", diz.


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