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Martin vive o detetive Jacques Clouseau, em cena do longa

RICARDO CALIL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O inspetor Jacques Clouseau é um herói da resistência. Mas não do movimento francês contra a invasão alemã na Segunda Guerra. No cinema, é um representante da luta pela sobrevivência de uma comédia mais inocente. Na vida ficcional, um personagem em constante luta contra a modernidade.
Interpretado pelo comediante inglês Peter Sellers (1925-1980) na série dos anos 60 e 70, o detetive francês reencarnou em Steve Martin nesta década e, agora, está em "A Pantera Cor-de-Rosa 2". Nele, Clouseau integra "dream team" de investigadores (vividos por Andy Garcia, Alfred Molina, entre outros) que tentam prender o ladrão que roubou lendários tesouros pelo mundo, incluindo o diamante que dá título ao filme.
Mas a trama importa menos do que o choque do arcaico Clouseau com o presente -sua insistência em confiar mais no bloco de notas do que no computador, o cavalheirismo datado de um lado e a incapacidade de se submeter ao vocabulário e ao comportamento politicamente correto de outro.
Para compor o personagem, Martin vai direto à fonte: o francês Jacques Tati (1907-1982), que melhor trabalhou essas contradições no cinema. No fim, o comediante americano não faz feio diante Tati, nem de Sellers -o que não é tarefa pequena. Corroteirista do filme, ele brinda o público com ao menos um par de gags verbais e visuais antológicas, como na cena em que cai de uma sacada do Vaticano vestido de papa.
Porém, como já é hábito na carreira de Martin, o entorno quase nunca está à altura de seu talento. Cerca-se de atores sem o mesmo timing cômico, mete-se numa trama decorativa, está à disposição de um cineasta burocrático (Harald Zwart). Se fosse dirigido por um Blake Edwards, o resultado poderia ser excepcional, não apenas digno. Assim, Clouseau finalmente faria as pazes com o presente.

Avaliação: regular