São Paulo, terça-feira, 22 de maio de 2007

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David Trueba vê a Espanha com outros olhos

Cineasta espanhol exibe e debate "Soldados de Salamina", filme que sugere releitura da guerra civil, em São Paulo

Obra do diretor é tema de ciclo promovido pelo Instituto Cervantes, que começa hoje no CCSP; entrada é gratuita

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em 2001, o catalão Javier Cercas descreveu um fuzilamento em massa promovido por soldados republicanos durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), no romance "Soldados de Salamina" (ed. Globo) e virou best-seller em seu país.
Dois anos depois, o diretor David Trueba adaptou essa mesma história ao cinema, venceu prêmios nacionais e ganhou projeção internacional.
Até bem pouco tempo atrás, sugerir o resgate de um intelectual franquista, eixo do romance de Cercas, na Espanha, seria condenar qualquer livro ou filme ao "paredón", por parte da crítica e do público. Cercas e Trueba, certamente, seriam condenados ao ostracismo por mexer num tema tabu.
Hoje, porém, reler de modo menos maniqueísta o conflito que dividiu a Espanha entre apoiadores de Franco e simpatizantes das milícias republicanas, é uma atitude tida como moderna e esclarecida.
Trueba, que vem ao Brasil para mostrar e debater seus filmes em mostra promovida pelo Instituto Cervantes, é um exemplo típico do momento revisionista que vive a Espanha.
"Durante o período de redemocratização, após a morte de Franco (1975), a tendência dos intelectuais e artistas espanhóis era promover uma leitura muito ideologizada da história. Os republicanos eram os bons, e os franquistas, os maus. Era o momento de denunciar a ditadura. Houve exagero, mas vejo isso como algo natural, uma espécie de força compensatória", disse à Folha.
Em "Soldados de Salamina", que será exibido hoje, na abertura do evento, Trueba busca um olhar mais contemporâneo sobre o conflito. O filme conta a trajetória de Rafael Sánchez Mazas (1894-1966), escritor madrilenho que ajudou a fundar a Falange -grupo paramilitar que apoiou o regime e depois transformou-se em partido oficial-, e de como foi salvo por um grupo de republicanos.
O episódio em que Mazas é poupado de morrer executado por um lampejo de compaixão do inimigo é relatado por uma jornalista que, nos dias de hoje, se interessa pelo inusitado destino do escritor e seu posterior ostracismo. "O filme não é um drama histórico, não se trata de reconstruir a guerra civil, mas de mostrar as questões que a Espanha de hoje tem a fazer àquele passado", diz.
Trueba, 37, é irmão do veterano Fernando Trueba, diretor de "Belle Epoque" (Oscar de melhor filme estrangeiro de 1994) e "O Milagre do Candeal", sobre Carlinhos Brown.

Documentário
O cineasta tem também um trabalho reconhecido como documentarista. Em 2002, ao lado de Carlos Bosch, escreveu o roteiro de "Balseros", que trata dos refugiados cubanos que arriscam a vida para chegar aos EUA a bordo de jangadas. O filme foi indicado ao Oscar de melhor documentário.
Na mostra em São Paulo será possível ver o curioso "La Silla de Fernando" (2006), o mais recente filme de Trueba, que tem o ator Fernando Fernán Gomez como protagonista.
Rosto pouco conhecido por aqui, Fernán Gomez é um dos principais atores do cinema espanhol. Está em filmes de Pedro Almodóvar ("Tudo Sobre Minha Mãe") e nos premiados "A Língua das Mariposas" (José Luis Cuerda), "O Feitiço de Xangai" e "Belle Epoque" (ambos do irmão Fernando).
O documentário de Trueba traz Fernán Gomez falando de modo ininterrupto. "Ele é conhecido pelo charme do seu modo de se expressar. Então decidimos colocar a câmera na frente dele e pedir que comentasse um monte de temas."
A mostra traz ainda os filmes de Trueba mais relacionados à dimensão particular da vida na Espanha. São pequenos dramas e comédias, como "Bienvenido a Casa" e "Obra Maestra".
Na sexta, o diretor debaterá sua obra com o público.


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