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David Trueba vê a Espanha com outros olhos
Cineasta espanhol exibe e debate "Soldados de Salamina", filme que sugere releitura da guerra civil, em São Paulo
Obra do diretor é tema de ciclo promovido pelo Instituto Cervantes, que começa hoje no CCSP; entrada é gratuita
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 2001, o catalão Javier
Cercas descreveu um fuzilamento em massa promovido
por soldados republicanos durante a Guerra Civil Espanhola
(1936-1939), no romance "Soldados de Salamina" (ed. Globo)
e virou best-seller em seu país.
Dois anos depois, o diretor
David Trueba adaptou essa
mesma história ao cinema,
venceu prêmios nacionais e ganhou projeção internacional.
Até bem pouco tempo atrás,
sugerir o resgate de um intelectual franquista, eixo do romance de Cercas, na Espanha, seria
condenar qualquer livro ou filme ao "paredón", por parte da
crítica e do público. Cercas e
Trueba, certamente, seriam
condenados ao ostracismo por
mexer num tema tabu.
Hoje, porém, reler de modo
menos maniqueísta o conflito
que dividiu a Espanha entre
apoiadores de Franco e simpatizantes das milícias republicanas, é uma atitude tida como
moderna e esclarecida.
Trueba, que vem ao Brasil
para mostrar e debater seus filmes em mostra promovida pelo
Instituto Cervantes, é um
exemplo típico do momento revisionista que vive a Espanha.
"Durante o período de redemocratização, após a morte de
Franco (1975), a tendência dos
intelectuais e artistas espanhóis era promover uma leitura muito ideologizada da história. Os republicanos eram os
bons, e os franquistas, os maus.
Era o momento de denunciar a
ditadura. Houve exagero, mas
vejo isso como algo natural,
uma espécie de força compensatória", disse à Folha.
Em "Soldados de Salamina",
que será exibido hoje, na abertura do evento, Trueba busca
um olhar mais contemporâneo
sobre o conflito. O filme conta
a trajetória de Rafael Sánchez
Mazas (1894-1966), escritor
madrilenho que ajudou a fundar a Falange -grupo paramilitar que apoiou o regime e depois transformou-se em partido oficial-, e de como foi salvo
por um grupo de republicanos.
O episódio em que Mazas é
poupado de morrer executado
por um lampejo de compaixão
do inimigo é relatado por uma
jornalista que, nos dias de hoje,
se interessa pelo inusitado destino do escritor e seu posterior
ostracismo. "O filme não é um
drama histórico, não se trata de
reconstruir a guerra civil, mas
de mostrar as questões que a
Espanha de hoje tem a fazer
àquele passado", diz.
Trueba, 37, é irmão do veterano Fernando Trueba, diretor
de "Belle Epoque" (Oscar de
melhor filme estrangeiro de
1994) e "O Milagre do Candeal", sobre Carlinhos Brown.
Documentário
O cineasta tem também um
trabalho reconhecido como documentarista. Em 2002, ao lado de Carlos Bosch, escreveu o
roteiro de "Balseros", que trata
dos refugiados cubanos que arriscam a vida para chegar aos
EUA a bordo de jangadas. O filme foi indicado ao Oscar de
melhor documentário.
Na mostra em São Paulo será
possível ver o curioso "La Silla
de Fernando" (2006), o mais
recente filme de Trueba, que
tem o ator Fernando Fernán
Gomez como protagonista.
Rosto pouco conhecido por
aqui, Fernán Gomez é um dos
principais atores do cinema espanhol. Está em filmes de Pedro Almodóvar ("Tudo Sobre
Minha Mãe") e nos premiados
"A Língua das Mariposas" (José Luis Cuerda), "O Feitiço de
Xangai" e "Belle Epoque" (ambos do irmão Fernando).
O documentário de Trueba
traz Fernán Gomez falando de
modo ininterrupto. "Ele é conhecido pelo charme do seu
modo de se expressar. Então
decidimos colocar a câmera na
frente dele e pedir que comentasse um monte de temas."
A mostra traz ainda os filmes
de Trueba mais relacionados à
dimensão particular da vida na
Espanha. São pequenos dramas
e comédias, como "Bienvenido
a Casa" e "Obra Maestra".
Na sexta, o diretor debaterá
sua obra com o público.
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