São Paulo, sábado, 23 de abril de 2005

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ARTE

Retrospectiva de Henry Moore na Pinacoteca, com obras feitas entre 1922 e 1985, leva visitante a passeio pelo modernismo

Exposição sintetiza dilemas da arte moderna

FELIPE CHAIMOVICH
CRÍTICO DA FOLHA

Henry Moore sintetiza a arte moderna. Suas obras reunidas na retrospectiva da Pinacoteca permitem acompanhar os passos que levam da vanguarda do entre guerras aos últimos suspiros modernistas do início da globalização. A amplitude de técnicas e períodos exibidos, com obras de 1922 a 1985, configura mostra de fôlego internacional.
Moore (1898-1986) nasceu na classe trabalhadora inglesa. Filho de um mineiro de carvão, tomou gosto pela arte por meio do estudo, no colégio. Após sofrer intoxicação pulmonar por armas químicas, lutando na Primeira Guerra, abraçou a escultura e o desenho para se tornar um dos mais consagrados artistas do século 20.
O traço de retratista fora exímio desde o começo, como revela "Mary, a irmã do artista" (1926). Mas a atração pela cultura material de sociedades alheias à repressora civilidade européia cedo mudaria o rumo de suas linhas.
Numa só vitrine, vemos a "Cabeça" (1923), de alabastro, a "Máscara" (1927), de pedra verde, e as "Duas Cabeças" (1924-25), de pedra de Mansfield, cuja concisão de formas e dureza de corte indicam a predileção por objetos tribais, bem como testemunham as viagens a sítios de pintura rupestre. A ancestralidade da pedra aparece repetidas vezes. Na série de litogravuras "Stonehenge" (1973), mostrando ângulos daquele local ritualístico, antevemos o sentido da maquete "Labirinto de Pedra: Projeto para Monumento na Colina" (1977).
A identificação com o surrealismo durante os anos 30 marcou a trajetória posterior do artista. As formas são assumidamente indeterminadas, mantendo associações orgânicas que sugerem seres partidos.
No octógono do edifício da Luz, a "Figura Reclinada Grande" (1972-73) é composta de quatro partes que se apóiam, mas não se encaixam: é antes o peso que as mantém unidas.
A admiração por Brancusi e Picasso sedimentaria a limpeza construtiva conducente ao diálogo com a abstração. Na "Composição" (1931), de alabastro, um volume antropomórfico ganha índices femininos pela sugestão de seios. Todavia o traço humano pode ser reduzido até um mínimo de dois orifícios, como na "Mãe e Filho" (1936), em pedra de Ançã.
O ideal modernista da auto-evidência da obra de arte reverbera em todo canto. Moore dirige-se ao eterno, como na recorrente composição da maternidade, um eco de arquétipos icônicos a transitar pelos milênios. Excetua-se o desenho "Perspectiva do Abrigo do Metrô" (1941), em que a a cena é situada nos bombardeios de Londres, durante a Segunda Guerra. Porém o conjunto não tematiza a história.
Rever a obra de Henry Moore é indagar sobre os destinos da arte moderna. A longa exploração da potência das formas extraídas de sólidos, seus cheios e vazios, conduz a um maneirismo de soluções que se repetem para consolidar o estilo próprio. Por outro lado, essa constância dá o tom heróico ao conjunto da obra, como um ideal independente dos reveses transcorridos. Ao comemorar cem anos de existência, a Pinacoteca do Estado escolheu ótimo espelho para refletir.


Henry Moore - Uma Retrospectiva/Brasil 2005
    
Quando: ter. a dom., das 10h às 18h; até 12/6
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, centro, tel. 3229-9844)
Quanto: R$ 4 (grátis aos sábados)


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