São Paulo, domingo, 24 de novembro de 2002

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Tradições carioca e pernambucana se cruzam no Ibirapuera, em encontro entre Paulinho da Viola e Antônio Nóbrega

Cochichos de Viola

Ana Ottoni - 14.ago.2002/ Folha Imagem
Paulinho da Viola


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando Antônio Nóbrega chamar hoje de manhã seu convidado especial Paulinho da Viola, duas das mais ricas tradições populares da música brasileira estarão se encontrando pela primeira vez no palco ao ar livre do parque Ibirapuera.
O carioca Paulinho vem aos paulistanos comemorar, com alguns dias de atraso, seu 60º aniversário, mas vem trazer também seus saberes de samba e choro.
Com sua banda, o cantor-compositor-ator-dançarino pernambucano Nóbrega, 50, é dono de maior parte do show inserido no projeto Ultragaz Cultural 2002, ao qual imprime suas raízes nordestinas populares-eruditas, adquiridas desde que era membro do Quinteto Armorial.
Promete fazer também um apanhado de frevos pernambucanos de Capiba, interpretando "Vassourinhas", "Frevo e Ciranda", "Cala Boca" e outros.
Paulinho e Nóbrega se apresentam juntos brevemente, mas abrangendo os dois pólos. Visitam o Rio do choro de Pixinguinha (em "Cochichando", desde os anos 70 incorporada a seu repertório) e do samba de domínio público "Miudinho". Mas Nóbrega conduz Paulinho também ao frevo de Pernambuco, via a "Evocação Nº 1" de Nelson Ferreira.
Paulinho fala da naturalidade do encontro: "Até já me perguntaram se eu faria um frevo. Acho que ninguém pode fazer melhor que os pernambucanos, mas tenho uma afinidade grande com a cultura nordestina, principalmente a pernambucana. Entre 68 e 78 visitei Recife regularmente, lá morava Canhoto da Paraíba, muito importante na minha vida".
"Minha afinidade com Nóbrega se dá um pouco pelo nosso temperamento, mais ligado à memória. Seu grupo tem familiaridade com o samba, vai me acompanhar em duas canções."
Em "Coração Leviano" e "Timoneiro", portanto, o sambista terá à disposição os instrumentos de oito músicos da banda de Nóbrega, com violões, cavaquinho, baixo acústico, viola, flauta, flautim, sax, clarinete e percussão.
Paulinho conta mais, fazendo brincadeira: "Nóbrega me pediu que cantasse "Miudinho", não sei se vai querer dançar junto comigo. Apesar de que, depois dos 60, não sei se ainda consigo dançar".
Nóbrega se une a ele, salientando as semelhanças: "Tenho a meu lado músicos que são chorões e que se dispuseram a tocar acompanhando Paulinho, o que também facilitou sua vinda para participar. Nossos trabalhos podem parecer diversos, mas nossos mundos musicais confluem numa tradição musical brasileira".
O artista nordestino radicado em São Paulo, que lançou há pouco o CD "Lunário Perpétuo", demarca a proximidade do samba com gêneros de sua região natal:
"A própria palavra samba ainda comporta no Nordeste formas e gêneros musicais muito diferentes, no seu sotaque, do que a gente conhece normalmente como samba. Há o samba de maracatu, as sambadas de cavalo-marinho, o samba de parelha".
Já com ligação menos direta com o samba, Nóbrega revisita também seu próprio passado. Deve abrir o show com "Ponteio Acutilado", do repertório do Quinteto Armorial, de que ele participava nos anos 70 sob orientação de Ariano Suassuna.

Gravadoras, jovens, 60 anos
Deixando a memória de lado e falando de presente e futuro, Paulinho da Viola conta que ainda não decidiu seu destino após a recente saída da BMG.
"Conversei muito com a [gravadora independente" Biscoito Fino, mas as conversas se interromperam um pouco por minha causa, porque fiquei envolvido com as comemorações do aniversário", afirma.
Paulinho comenta o recém-lançado disco duplo da carioca Teresa Cristina, que se debruça sobre sua obra e foi lançado no Rio com show-homenagem, no dia 12 passado, data exata do aniversário de 60 anos de Paulinho.
"Senti não ter ido ao show, mas era meu aniversário e meus amigos foram me cumprimentar em casa. Teresa Cristina é uma artista maravilhosa, seu disco é muito bonito. E ela compõe, também."
Sua discípula não tem participação prevista no evento de hoje, mas Nóbrega cede espaço no show à Zabumbau - Orquestra Jovem Brasileira de Percussão. Idealizado pelo próprio Nóbrega, o grupo tem coordenação musical de seu filho, Gabriel Almeida.
E Paulinho da Viola conta, por fim, como foi fazer 60 anos: "Foi indolor. Foi bom, legal. Os amigos ligaram, mas não houve nenhuma festa, só uma reunião em casa mesmo. Não teve nada de especial". E a vida continua, cochichando domingo no parque.



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