São Paulo, terça-feira, 24 de novembro de 2009

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Crítica/"Exercício nº 2 - Formas Breves"

Inventividade não satisfaz pretensões que peça anuncia

Depois de cinco anos sem encenar, Bia Lessa reúne colagens de vários autores em novo exercício de radicalidade cênica

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Cena da peça "Exercício nº 2 - Formas Breves", de Bia Lessa e Maria Borba, em cartaz em SP

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

O espaço cênico como uma linguagem em si, matéria-prima de uma poética. Esse é o desejo que formula o espetáculo "Exercício nº 2 - Formas Breves", escrito e encenado por Bia Lessa e Maria Borba. Esse foi também o sonho da encenação moderna, maturado pelos inventores de uma cena autônoma do drama, e concretizado de modos diversos por encenadores contemporâneos.
Depois de cinco anos sem encenar, Bia Lessa retoma experiência de 1987. Em "Exercício nº 1" ela arriscou-se em um espetáculo sem palavras e só com ações e movimentos em torno de formas básicas -papel picado e caixas de papelão. No retorno àquele projeto de risco, a referência primordial é a literatura. Não enquanto suporte ficcional, ainda que por meio de extratos literários se esbocem algumas cenas, mas como materialidade inscrita no tempo da apresentação.
O ponto de partida é o livro "Formas Breves", do autor argentino Ricardo Piglia, de que se empresta, além do nome, a ideia da forma literária como algo que configura mundos possíveis. Acrescente-se a perspectiva de um teatro que se furta à ficção dramática e, servindo-se do efêmero da situação presencial, se oferece incompleto, em fuga, recusando o acabamento da trama. Neste lugar, entre o drama e a narrativa em prosa, muito próximo da poesia, Lessa constrói sua cena.
O nicho em que tudo transcorre é um corredor por onde os 17 jovens atores esboçam suas aparições fugazes. O espaço restante permanece escuro, pontuado em toda sua extensão por fios de alumínio, como uma floresta de linhas. No chão, entrevisto no breu desse conjunto, um tapete de trajes e panos escuros, a serem ora alçados, ora esquecidos.
Ao longo da montagem se intercalarão, a cada uma das cenas relâmpago, projeções de textos numa tela ao fundo e a movimentação vertical da massa de fiapos, servindo aos atores para constituir situações quase dramáticas. Assim, por exemplo, enquanto um poema de Sérgio Sant'anna sobre suicídio frustrado é projetado, os atores, que trazem consigo barbantes, indicam a situação de emergência hospitalar trançando-os nos fios pendurados.
A inegável beleza e inventividade da escritura cênica apresentada não são, contudo, suficientes para atender às pretensões que se anunciam, de investigar o "homem em sua individualidade", ou de percebê-lo "um vazio cheio de possibilidades". Essas intenções bem como a recusa à facilitação no modo de realizá-las são estimulantes. O problema é que, até pela ligeireza, fica tudo em suspenso, no meio do caminho entre a contundência que a forma de um poema pode alcançar e a vaga sugestão de uma imagem momentânea.
Bia Lessa é bem-vinda de volta às explorações mais profundas. Fôlego não lhe falta. Mas pode, sim, afinar seus sensores para além do simples encantamento.


EXERCÍCIO Nº2: FORMAS BREVES

Quando: sex. e sáb., às 21h, dom., às 18h; até 13/12
Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, tel. 5080-3000)
Quanto: R$ 5 a R$ 20
Classificação: 16 anos
Avaliação: bom




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