São Paulo, terça-feira, 25 de junho de 2002

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BALLET DA ÓPERA NACIONAL DE PARIS

"Jóias" é jóia, muito, tudo, Odara, coisa rara, reflexo do esplendor

INÊS BOGÉA
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

Com a obra-prima do balé romântico "Giselle" e um clássico moderno de Balanchine, "Jóias", o Ballet da Ópera Nacional de Paris chega novamente aos palcos brasileiros. A estréia foi no Rio; a companhia passa agora por São Paulo e termina a temporada em Brasília. Para quem gosta de dança, é uma oportunidade rara de ver uma das maiores companhias em atividade. Quem não gosta de dança, está doente: da cabeça ou do pé.
O tríptico "Jóias" (1967), uma homenagem de Balanchine (1904-83) à França, aos Estados Unidos e à Rússia, foi incorporado ao repertório da Ópera em 2000, com cenários e figurinos novos de Christian Lacroix. Como de praxe, a música é tocada ao vivo, regida pelo maestro da companhia. No Rio, a orquestra foi a Sinfônica Brasileira, que se saiu bem sob a regência de Paul Connelly.
Na primeira parte, "Esmeraldas", o palco se transforma em calmaria, um mar de bailarinas de tutu romântico dando vida às melodias de Fauré. Não é nada fácil dançar no palco inclinado do Municipal do Rio, o que explica pequenos deslizes -que não chegaram a comprometer, mas não permitiram que a dança chegasse a seu máximo.
"Rubis", com música de Stravinski ("Capriccio"), é a própria essência do estilo de Balanchine: linhas quebradas, o centro do corpo deslocado, acentos sincopados, movimento veloz. Gestos interrompidos, congelando os movimentos. Uma dança sensual, inspirada no jazz. A dificuldade aqui é equilibrar a rapidez com a precisão, dando espaço para a projeção do quadril. Delphine Moussin: ligeira, esperta, mas ainda não achou o "swing".
Já a última parte, "Diamantes", sobre a "Sinfonia nš 3" de Tchaikovski, teve o brilho dos grandes momentos da dança. Agnès Letestu desenhou divinamente as linhas estiradas do corpo. Suas pernas têm a dinâmica do mestre, com braços que suavizam e dão flexibilidade ao torso. E o "partner" Jean-Guillaume Bart foi seguro nos giros e nas variações. A dança clássica, aqui, vê suas poses alongadas pela dança russa, ao mesmo tempo em que marcadas pela lembrança dos clássicos de Petipa ("O Lago dos Cisnes", "A Bela Adormecida"). É uma dança da memória da dança; e ficará para sempre na memória de quem viu essa dupla dançar.
Da memória à coisa em si: "Giselle" é uma remontagem criada em 1991, baseada no original de 1841, com cenários e figurinos reconstituídos dos croquis de Alexandre Benois, de 1924.
O segredo da coreografia está no contraponto da primeira com a segunda parte. A alegria ingênua do primeiro ato, com as danças camponesas, contrasta com as noturnas, aéreas "Willis" no ato dois. Sábado, em São Paulo, os solistas Nicolas le Riche e Laëtitia Pujol foram a encarnação do espírito romântico, com a leveza de uma dança matinal e solar -e o peso e a grandeza de uma paixão maior do que todas as noites do mundo.
A dificuldade foi a orquestra, regida por Ermanno Florio -que não teve culpa. Com só dois ensaios, ninguém tocaria bonito; muito menos esse conjunto formado de última hora. É preciso dizer com franqueza: não se pode trazer uma companhia como o Ballet da Ópera de Paris para dançar com uma orquestra de arremedo.
De qualquer modo, a dança teve grandes inspirações. O Ballet da Ópera segue sendo, com justiça, uma referência do balé clássico. Não só nas tabelas, não só nos livros, mas no coração da dança dentro de nós.


Ballet da Ópera Nacional de Paris    
Programa: Jóias
Quando: hoje e amanhã, às 21h
Onde: Teatro Municipal (pça. Ramos de Azevedo, s/n, região central, tel. 222-8698)

Quanto: de R$ 50 a R$ 300


A crítica Inês Bogéa viajou a convite da produção



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