São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2004

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ARTES PLÁSTICAS/CRÍTICA

Um dos mais importantes do construtivismo, artista tem 90 obras expostas no MAM

Com expressividade, Barsotti realiza jogo entre geometria e cor

CAUÊ ALVES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Em meio à profusão de exposições que a cidade oferece no período da Bienal, "Hércules Barsotti: Não-Cor Cor", no MAM, não pode passar em branco. Além de uma justa homenagem aos seus 90 anos (60 de carreira), a mostra recupera a trajetória de um dos mais significativos artistas construtivos do Brasil. Apreciar 90 trabalhos de 50 instituições e coleções particulares, de uma obra de referência para a história da arte como a de Barsotti, é uma oportunidade rara.
Seu percurso artístico começa no final dos anos 40 e se desenvolve na década seguinte durante as intensas polêmicas entre abstração geométrica e informal, que alimentaram o debate do período. Em obras da segunda metade da década de 50 e início dos anos 60, o contraste entre o preto e o branco e uma elaborada organização geométrica criam ilusões de afastamento e aproximação do plano da tela, como se ela estivesse suavemente envergada.
São dessa época os trabalhos em que pinta vãos e intervalos negros nas bordas da superfície como se fossem sombras de um quadro vazio. Com poucos elementos e dialogando com trabalhos de Mondrian, Van Doesburg e Albers, em que predomina uma harmoniosa limpeza formal, ele desenvolve caminho singular.
Enquanto a tendência construtiva no Brasil tende para a polarização entre os artistas concretos de São Paulo, liderados por Waldemar Cordeiro, e os neoconcretos do Rio, o paulistano Barsotti, borrando as fronteiras dessa esquemática oposição, se aproxima de Ferreira Gullar e do neoconcretismo. Não realiza trabalhos em três dimensões, como Amílcar de Castro, Aluísio Carvão, Lygia Clark e Hélio Oiticica, mas "Barsotti explora o quadrado enquanto conteúdo e continente, em suas relações espaciais internas aos limites da tela e externas a ela, isto é, em relação com as premissas horizontais e verticais do espaço arquitetônico", escreve a curadora Ana Maria Belluzzo.
A mostra traz também duas obras de um de seus principais interlocutores, o artista Willys de Castro, com quem fundou o Estúdio de Projetos Gráficos, em 1954. Juntos realizaram cartazes e marcas e participaram da renovação do design gráfico que os meios de impressão industrial e o surto desenvolvimentista do período propiciaram. Além de pinturas, desenhos e gravuras, integram a exposição roupas com estampas e padronagens de tecidos desenhados por Barsotti no fim dos anos 60.
Principalmente nas telas dos anos 70, o suporte do quadro gira 45 graus em relação à parede e seus formatos variam entre losangos regulares e irregulares, tanto verticais quanto horizontais. O percurso da mostra deixa claro o crescente interesse do artista pela cor e o abandono do rigor objetivo. Com apurada sensibilidade cromática, aliada a uma investigação das contradições inerentes ao espaço, que nunca é tratado de modo homogêneo, Barsotti passa a construir seus quadros pela aproximação de diversos tons.
Além da compreensão física da cor -algumas de suas obras remetem a prismas-, lhe interessa a qualidade e a potência das cores. Sua produção, que nesse período continua insinuando volumes, como se as formas inchassem, mescla diversos timbres de cor e variações de um mesmo tom. Se a geometria está mais próxima da razão e a cor, da sensibilidade e da intuição, Barsotti experimenta um jogo entre ambas em que ganha a expressão.


Hércules Barsotti
    
Onde: MAM (pq. Ibirapuera, portão 3, tel. 5549-9688)
Quando: ter., qua., sex., das 12h às 18h; qui., das 12h às 22h; sáb., dom., das 10h às 18h; até 24/10
Quanto: R$ 5 (grátis aos dom.)



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