São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2008

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Aznavour faz compras e dá adeus a SP

Descendente de armênios, cantor conta que faz fotos das cidades que visita; em SP, se anima com a estação Armênia de Metrô

Último concerto da turnê de "despedida" ("Farewell Tour') acontece nesta noite, no Via Funchal; repertório terá poucas mudanças


Henrique Manreza/Folha Imagem
O cantor parisiense durante entrevista concedida na última terça-feira, em um hotel paulistano

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Atenção, vendedoras de lojas populares de roupas. Se um senhor baixinho e de cabelo esbranquiçado, parecido com o Charles Aznavour, estiver caminhando entre cabides atrás de ofertas, não se assuste. É mesmo o Charles Aznavour.
De volta ao Brasil devido ao sucesso da passagem de sua turnê "de despedida" ("Farewell Tour") por aqui, em abril, o cantor francês de 84 anos tem gastado o tempo livre caminhando e fazendo compras. "Essa blusa amarela é da Riachuelo. Agora quero voltar lá e comprar uma de cada cor", contou à Folha, mostrando a camiseta tipo pólo que levava sob a jaqueta. Além dela, também Havaianas e quadros de artistas de rua enchem as malas que levará de volta à França.
O sucesso dos shows no primeiro semestre levou o cantor a querer voltar neste mês para uma versão estendida do roteiro original, incluindo mais cidades (leia ao lado). O ponto final do novo "adeus" será hoje, no Via Funchal, em São Paulo.
Em entrevista concedida na suíte de um pomposo hotel paulistano, Aznavour falou das diferenças que notou no Brasil desde sua primeira visita à América do Sul, no final dos anos 50. "Há lugares que mudam muito e outros que não mudam nada. Buenos Aires está igual. O Rio tem mais gente. São Paulo tem mais prédios."
Munido de sua máquina fotográfica, o cantor costuma sair às ruas das cidades que visita tirando fotos. "Não faço imagens turísticas, mas sim que possam dizer algo sobre o lugar em que estive." Em São Paulo, na visita anterior, soube que havia uma estação Armênia do metrô. Como seus pais são imigrantes desse país, o parisiense Aznavour -cujo nome de batismo é Shahnour Vaghinagh Aznavourian- quis conhecer o lugar para fotografá-lo.
Enquanto fala, busca imagens recentes que registrou aqui. Uma delas é a de um grupo de latas de lixo reciclável de um aeroporto. "Serve para mostrar que há coisas boas no Brasil", explica. Já um registro nada positivo, feito em Curitiba, exibe um menino de rua.
"Também filmo, mas prefiro as fotos. Num filme tudo passa rápido. A foto diz mais sobre aquele momento, como você estava vestido, em que pensava etc. As fotos são também perfeitas para os pintores frustrados como eu", ri.
Autor de mais de 850 músicas e tendo vendido mais de 100 milhões de discos até hoje em sua carreira, o rei da canção francesa acha que a sua não é uma arte duradoura.
"No final, o que fica como legado para a humanidade são as grandes pinturas, as grandes obras de arquitetura; as construções e suas ruínas. A música desaparece", conclui, mas sem demonstrar tristeza.

Imitações
A mesma frustração Aznavour demonstra com relação à música dos dias de hoje. Ao comentar o que tem ouvido no Brasil, diz que o cenário é dos piores. "Havia algo novo nos anos da bossa nova, todos os artistas que surgiram lá ou na seqüência tinham um impulso criativo original, que tomava as coisas do Brasil, a política, a cultura, para inventar uma musicalidade que, mesmo tendo um elemento americano, como o jazz, era muito brasileira, pois incrementou o samba."
E enfileira então seus preferidos, João Gilberto, Tom Jobim, Elis Regina e Maria Bethânia. Também elogia Alcione, de quem assistiu a um DVD recentemente. "Outro dia estava vendo uns artistas jovens na TV. Eles já não se preocupam em manter um ingrediente brasileiro. Há menos melodia e mais vontade de parecer com os norte-americanos. Cantar como Mariah Carey, Madonna. Antes, o Brasil era o que todos queriam imitar. Hoje é ao contrário, os brasileiros querem fazer música como os estrangeiros. Não vão conseguir repetir o sucesso de antes", vaticina.
E é para orientar as novas gerações que Aznavour diz estar escrevendo um livro. "Trata-se de um manual sobre como lidar com a fama, como cuidar dos detalhes que podem fazer o seu sucesso desaparecer. E, o mais importante, para ensinar que não se deve deixar de viver por causa de sua carreira."

Último show
O final de sua turnê brasileira, hoje, terá praticamente o mesmo repertório. A única alteração será a substituição de duas ou três músicas para suas versões em espanhol.
"Achei que há menos gente compreendendo o francês aqui como antes. E gosto de cantar em espanhol, por isso vou fazer essas mudanças."
Aznavour conversa muito com a platéia durante os espetáculos, mas tem suas restrições. "Quando o público aplaude o espetáculo, os músicos que estão comigo, eu me envolvo e quero falar. Quando sinto que só batem palmas quando eu entro no palco, meu humor muda. Preciso saber que as pessoas estão ali por causa de todo o conjunto, e não apenas por minha causa", diz. "Aí, sim, me sinto à vontade para bater papo."
São quase oito horas da noite da última terça-feira. Aznavour é informado de que o shopping center mais próximo fecha às 22h. "Temos pouco tempo, vamos às compras." Apressadamente, despede-se da reportagem e agasalha-se para sair.


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