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CINEMA
É Natal, é Natal, tudo bem, mas fuja dessa
SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK
Manual de Hollywood, verbete
"Natal, fazer dinheiro fácil no":
1. escreva um roteiro que pinte a
vida familiar no subúrbio como o
paraíso na Terra, mesmo para um
jovem milionário, solteiro, bonito
e em ascensão;
2. coloque um pouco de mágica,
um efeito algo sobrenatural;
3. escolha para o papel um ator
que agrade a audiência mais exigente (que o viu em "Arizona
Nunca Mais") e a massa ignara
(que o viu em "Con Air, a Rota da
Fuga");
4. para o papel da mulher, uma
atriz que não seja muito bonita,
assim as espectadoras não vão
sair do cinema achando que aquilo não poderia acontecer com elas
(ou você pensa que na vida real
Leonardo DiCaprio ficaria mesmo de quatro pela gordota Kate
Winslet, de "Titanic"? Basta ver
com quem ele tenta namorar há
muitos meses...).
Cumpridos os quatro itens, você tem pouco mais do que nada.
Ou "Um Homem de Família", em
cartaz em São Paulo desde sexta,
dirigido por Brett Ratner (ninguém, não se preocupe), com Nicolas Cage e Téa Leoni.
Jack Campbell (Cage), mago do
mercado financeiro de Nova
York, sempre acompanhado de
mulheres lindas e Ferraris, encontra um "anjo"/assaltante numa
mercearia que lhe oferece um gostinho do que seria sua vida se ele
não tivesse abandonado a namorada da faculdade (Leoni).
Nosso herói acorda no dia seguinte no mundo bizarro que é a
suburbia americana, onde tudo
que ele trabalhou para escapar é
realidade. Está casado com Kate, a
tal mocinha que tentou impedir
que ele fosse a Londres fazer a
pós-graduação. Trabalha na loja
do sogro vendendo pneus, tem
dois filhos, uma casa em New Jersey, um guarda-roupa infeliz.
Assim que se transforma no
perdedor arrependido, sua vida
vira uma sucessão dos piores momentos familiares. O filme é quase pornográfico neste sentido. Está tudo lá: cocô mole de bebê, sogros que falam alto e chegam em
casa sem avisar, uma minivan que
não pega de manhã, a mulher de
mau-humor, o shopping center
lotado no fim-de-semana.
O resultado é que você não se
interessa por ninguém, nem com
o vitorioso arrogante de Wall
Street nem com o perdedor amargo do subúrbio. Não dá vontade
de ser Nicolas Cage, nem Téa Leoni, nem o "anjo". Na verdade,
nem você, o palhaço que pagou
para ver aquilo.
Os dois atores estão em suas
piores interpretações. Téa Leoni
tem, basicamente, duas personagens. Uma é a gostosa com pernas
de bailarina, que ela exibe, no filme "Procurando Encrenca". A
outra é a atrapalhada, em que exibe a dentuça que não consertou,
como no seriado "The Naked
Truth". Aqui, opta pela segunda
opção, infelizmente.
Por fim, uma constatação:
Hollywood ainda não sabe o que
fazer com o negro. Ou ele brilha
em filme de orientação étnica (ou
seja, para as platéias do gueto) ou
é transformado num ser assexuado e mágico (ou seja, inofensivo).
É assim em "Conduzindo Miss
Daisy" (o motorista Morgan Freeman), "À Espera de um Milagre"
(o gigante Michael Clarke Duncan). E é assim com Don Cheadle,
o "anjo" transformador de "Um
Homem de Família".
Um Homem de Família
The Family Man
Produção: EUA, 2000
Direção: Brett Ratner
Com: Nicolas Cage, Téa Leoni
Onde: em cartaz nos cines Astor,
Eldorado 4, Jardim Sul 9 e circuito
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