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São Paulo, sábado, 28 de junho de 2003

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VISUAIS

Exposições individuais de Laerte Ramos e Rogério Degaki pontuam diferenças de atitude em relação à história da arte

Elegância e kitsch convivem em galeria

JULIANA MONACHESI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Na produção artística contemporânea, retratar a paisagem urbana é mania em que ninguém se aventura impunemente. Fotografias de ruínas (arquitetônicas ou humanas) são o recurso mais comum para abordar o caos nas metrópoles.
Os trabalhos de Laerte Ramos, que realiza sua primeira exposição individual a partir de hoje na galeria Casa Triângulo, vão na contramão da obviedade. As xilogravuras do artista possuem concisão digna dos fotógrafos Bernd e Hilla Becher.
O paralelo com o casal alemão -que documenta com frieza edificações industriais, como caixas d'água e moradias pré-fabricadas- não é superficial: as séries de gravuras de Ramos podem ser vistas como inventários de contêineres, armazéns, veículos de roda, poços, bate-estacas.
Filho de engenheiro, o artista conta que foi sempre fascinado por essa visualidade. Mas ele não a reproduz nas obras e opta por simplificar as formas ao máximo, inclusive no uso das cores. As gravuras são todas pretas e protagonizam um jogo de peso e leveza em que é o branco do papel que comprime a cor, e não o inverso.
Diante das formas sérias e esquemáticas, sem redundância de traços, é possível divisar um universo lúdico. No grupo de gravuras intitulado "Sobre-Rodas", por exemplo, há um subgrupo de carrinhos de bebê.
Na série de 20 pequenos trabalhos feitos a partir de um jogo de montar (tijolinhos de madeira), Ramos retrata o zoneamento da cidade de São Paulo: são 19 zonas (residencial, comercial, industrial etc.) mais uma, a "Zona 0", único lugar próprio para os sonhos.
Dividida entre os quatro espaços principais da galeria, a exposição de Laerte Ramos surpreende quando se chega à sala do terraço, com pequenas pinturas coloridas. Apesar de o imaginário da mineração e dos veículos persistir, as obras somam à gramática visual do artista bombas e forcas (em traços igualmente esquemáticos) sobre um fundo vermelho.
Se o tema da guerra sobrevém, refere-se a conflitos urbanos travados aqui mesmo, em São Paulo. É o tema do "soterramento" das casas em bairros tradicionais para que se construam prédios, como em Moema, onde o artista mora.
É o tema, abordado por ele em intervenção urbana (abril de 2002) na saída do túnel que liga a avenida Rebouças ao Pacaembu, do uso do espaço público: desenhando com a fuligem da poluição, Ramos levou a prefeitura a interditar o túnel para limpeza.
Na última sala da Triângulo, uma mudança de paradigma artístico: a exposição individual de Rogério Degaki acena com uma crítica à tradição da escultura que beira o deboche. Dono de uma trajetória consistente de releitura dos clássicos, o artista aborda nesses bibelôs agigantados referências escultóricas filtradas por artistas como Jeff Koons e Takashi Murakami. São monumentos aos heróis contemporâneos.


LAERTE RAMOS E ROGÉRIO DEGAKI. Onde: galeria Casa Triângulo (r. Bento Freitas, 33, região central, tel. 3331-5910). Quando: abertura hoje, das 12h às 18h; de ter. a sáb., das 11h às 19h; até 24/7. Quanto: entrada franca. Valor das obras: de R$ 600 a R$ 6.000.


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