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Peça dá voz para personagem secundária de "Crime e Castigo"
Kama Ginkas traz ao Brasil montagem baseada na miséria de Katerina Ivánovna
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Numa de suas noites numa
engordurada taberna de São
Petersburgo, o protagonista de
"Crime e Castigo", o estudante
Ralskólnikov, é abordado por
um beberrão que lhe conta sobre a vida miserável que leva:
ele, Marmieládov, três filhos
menores e a mulher, Katerina
Ivánovna.
Esta personagem secundária
do romance do russo Fiódor
Dostoiévski, publicado em
1866, ganha corpo e voz no espetáculo teatral "K.I. do Crime" -suas iniciais.
A montagem do diretor lituano Kama Ginkas (pronuncia-se
"guinkas"), um solo da atriz Oksana Mysina, estreou em Moscou há 12 anos. Conquistou
prêmios e viajou a outros países
da Europa e EUA.
O Brasil pode assisti-la desde
a semana passada, quando estreou no 7º Cena Contemporânea-Festival Internacional de
Teatro de Brasília. Em São Paulo, haverá sessões de hoje (para
convidados) a domingo, no
Sesc Ipiranga. Na próxima semana, é a vez da também 7º edição do evento riocenacontemporânea, no Rio.
No livro, Katerina Ivánovna é
apresentada sob o ponto de vista do marido. Na dramaturgia
adaptada por Daníl Gink, 37, filho de Ginkas, 65, ela surge em
desespero após a morte do marido, que se autodenominava
"um porco". Soma-se ao baque
a tuberculose que abate a viúva,
magra e irascível também por
causa da fome, a ponto de encaminhar a filha mais velha, adotiva, para a prostituição.
"Como Dostoiévski, preocupamo-nos não somente com os
problemas sociais, que existem
na Rússia de ontem e de hoje,
como em outros países. O que
nos interessa é o problema do
ser humano e a sua relação com
Deus", afirma Ginkas.
Inevitável a associação com
Jó, personagem bíblico. "Todo
humano tem o direito de perguntar: por que estão me obrigando a provações para mostrar o meu lado negativo? Todo
ser contém as faces do santo e
do demônio", diz o diretor, que
atende a reportagem em quarto
de hotel em São Paulo.
Em "K.I. do Crime", a personagem como que convida o público a entrar em seu quarto,
um canto frio onde ela organiza
um almoço em memória do
marido, uma cerimônia tradicional entre os russos após a
morte de um familiar.
Nesse espaço opressivo -em
São Paulo, a garagem do Sesc
Ipiranga é adaptada para cerca
de 80 pessoas-, vem à tona o
estado confuso de Ivánovna,
em meio às crianças (três atores russo) ao seu lado.
Remoinho
Oksana Mysina interpreta o
texto em russo, mas lança frases em português e inglês, aqui
e ali, o que não significa clareza
no discurso que remoinha.
Guinkas chegou a ensaiar a
peça com a veterana Mariana
Neyolova (que passou há pouco
pela cidade com "O Capote"),
mas problemas na agenda impediram que ela seguisse. Mysina abraçou o projeto de tal forma, desde a estréia em 1994,
que o espetáculo tornou-se sua
extensão orgânica. "Não poderia ser feita por outra mulher",
diz o encenador-pedagogo ligado ao Teatro do Jovem Espectador de Moscou (1918).
"K.I. do Crime" encerra o
projeto Estação de Teatro Russo-Brasil 2006, que desde julho
trouxe cinco montagens daquele país, uma realização da
Funarte/MinC, Sesc SP e Festival Internacional de Teatro Anton Tchecov, entre outras parcerias. Mais detalhes no site
www.teatrorusso.com.br.
K.I. DO CRIME
Quando: estréia amanhã, às 21h; sex.
e sáb., às 21h; dom., às 20h; até 1º/10
Onde: Sesc Ipiranga (r. Bom Pastor,
822, tel. 3340-2000)
Quanto: R$ 15 (ingressos esgotados)
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