São Paulo, terça, 29 de setembro de 1998

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SHOW
Compositor apresenta o conterrâneo Chico Mello, músico radicado em Berlim, hoje, em show no Itaú Cultural
Arrigo defende o Paraná em São Paulo

Divulgação
O músico Chico Mello, que se apresenta com Arrigo Barnabé hoje



PAULO VIEIRA
especial para a Folha

Embora fundador da dita "vanguarda paulistana", o compositor Arrigo Barnabé é paranaense -e é exatamente ser paranaense a exigência que impôs aos parceiros dos shows que está levando a cabo às terças no Itaú Cultural.
Já dividiu o palco com Carlos Careqa, autor do malicioso verso "Eu gosto de Curitiba". Hoje é a vez de Chico Mello, 41, cantor, compositor e violonista radicado em Berlim, que, como Arrigo, faz crossing-over entre o popular e o erudito.
Embora tenha estudado música contemporânea na Alemanha, Mello vai aproveitar seus conhecimentos de interpretação dhrupa, técnica do norte da Índia, no show de hoje.
"O show é mais dele do que meu, nem sei o que vou apresentar", disse Arrigo à Folha. Mello sabe. Vai mostrar canções que considera "fronteiriças". Elas estarão no disco "Do Lado da Voz" e têm nomes como "Do Lado do Dedo", "Do Lado de Lá".
"Eu acho que é um trabalho bem no meio entre o popular e o contemporâneo", define. Mello compara as interpretações "à indiana" que mostrará com os primeiros discos de João Gilberto e até com o drum'n'bass.
"Os espaços temporais são bem longos, eu encomprido as notas. O ouvinte escuta a melodia num sentido muito diferente do padrão radiofônico."
Mello também pensa em usar alguns efeitos harmônicos vocais. "Aprendi com os indianos uma técnica de movimentos de boca que me permite produzir sons que ninguém escuta."
Mello tem vários projetos paralelos, que tomam sua formação de música contemporânea como esteio. No Brasil, estudou com o introdutor do dodecafonismo no país, o compositor alemão Hans-Joachim Kollreuter.
"O dodecafonismo foi onde eu comecei, digeri muito minimalismo norte-americano, mas a MPB tem sido minha fonte de inspiração. Procuro deslocá-la do contexto, faço colagens, há peças para orquestra com vários choros sobrepostos. Um dos meus discos se chama "Música Brasileira Descomposta'."
Mesmo na Alemanha, Mello canta em português. "O texto não é o veículo principal, então não faz diferença nenhuma em que idioma eu canto."
O músico, que vê semelhanças em seu trabalho com o de Tom Zé, Tim Rescala e o próprio Arrigo, leva ao Itaú os músicos Guello (percussão), o alemão Burkhard Schlotthauer (violino) e Sergio Albach (clarinete).
Estão previstas reinterpretações para clássicos da música brasileira, como "Rosa" (Pixinguinha/Otavio de Souza).
² Arrigo
Arrigo acha a música feita no Paraná "muito original, genuína", mas não arrisca uma razão para isso. (Mello já fala numa ausência de tradição de música popular em Curitiba, daí, o que mais se aproxima da "identidade local" é a música experimental.)
Arrigo diz ver agora "com mais clareza" o que quer da própria carreira. "Eu sempre me interessei pela fusão do popular com o erudito, mas tinha uma ansiedade muito grande em ser aceito pelos músicos da cultura popular. Hoje já não me preocupo tanto com isso", afirma.
Arrigo acaba de colocar na praça "Gigante Negão", CD com a gravação da ópera-pop homônima levada um fim-de-semana de 1990, no Palace.
Arrigo renegava o trabalho, que considerava "descartável, desprezível". "Tenho uma autocrítica severa, e quando a coisa não dá certo, já vou logo colocando a culpa em mim. Perdi US$ 20 mil com aquela montagem, e nunca tinha ouvido a gravação daquilo. Quando ouvi, vi que havia coisas interessantes."
O compositor já havia perdido as partituras de "Negão", e se surpreendeu quando o técnico de som Marcelo Salvador o procurou há um ano dizendo ter a gravação da ópera.
A ópera, que contou com as participações de Mário Manga (voz e guitarra) e Itamar Assumpção (voz), introduzia conceitos estranhos à época, como o de clonagem -o "Gigante Negão" é um ser criado em laboratório numa disputa entre dois cientistas rivais.
"Acharam aquilo incompreensível, hoje o assunto está mais na mídia. Mas eu saí daqueles shows deprimido, o Palace foi uma escolha totalmente equivocada, tinha um leilão de gado na véspera, a gente nem pôde ensaiar..."
Outras informações sobre Chico Mello podem ser encontradas no site www.timescrap.de.
²
Show: Chico Mello e Arrigo Barnabé Onde: Itaú Cultural (av. Paulista, 149, região central, tel. 238-1700) Quando: hoje, 18h30 Quanto: entrada franca


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